Só falta uma semana
1. No domingo 5 de Junho, à noite, o panorama político português vai ser, acredito, varrido pelo bom senso. Porque não há tempo a perder, num instante, desvanecer-se-á esta campanha insípida e às vezes deprimente, em que pouca coisa de interessante se debate, e até às vezes os políticos colocam na boca dos outros as palavras que eles não disseram para poderem fazer as críticas que em outro caso não teriam oportunidade de concretizar.
De repente, por milagre, veremos transbordar o sentido de Estado e também veremos, noutro plano, os partidos criarem imediatamente as condições para o diálogo que agora recusam.
Todos sabemos que Pedro Passos Coelho não sobreviveria a uma derrota porque o PSD é imprescindível ao próximo governo mesmo que o PS ganhe.
E ontem ficámos a saber que o presidente do PS, Almeida Santos, acredita que, se o PS perder, José Sócrates sai da liderança. Disse-o numa entrevista ao semanário Sol. "Eu tentarei tudo por tudo mas vai ser difícil [que José Sócrates não saia da liderança do PS se perder]. Ele próprio há-de querer fazer tudo para simplificar uma solução nacional, e talvez o afastamento dele simplifique. Ele é um patriota."
Ou seja, no dia 5 de Junho, muitas certezas vão cair. Muita humildade se vai revelar. Muito e urgente trabalho vai ter de começar a fazer-se.
Um dos partidos, PS e PSD, vai ganhar; o outro, mais que provavelmente, vai ter de mudar de líder porque há consensos que o País tem urgência de promover.
Só temos pela frente mais oito dias de carnaval.
Vista assim, a campanha aguenta-se...
2. O Tribunal de Oeiras decidiu dar razão ao PCTP/ /MRPP e obrigar as televisões generalistas a produzir até ao fim da campanha todos os frente-a-frente que os outros partidos concorrentes às eleições quiserem ter com Garcia Pereira, o líder do partido recorrente. No máximo, haverá 16!
Imagino que na interpretação do juiz, escrupuloso e atento ao espírito da lei, devesse ter havido mais de 200 debates neste período! Todos contra todos. A democracia levada ao êxtase neste cantinho da Europa.
Se mesmo os partidos representados na Assembleia aderirem a esta sentença, Garcia Pereira terá uma semana de glória. Fará três a quatro debates todos os dias (em prime-time, please, em prime-time), e poderemos, então, revisitar mesmo as velhas discussões marxistas. Eu, que descendo nos plenários de Abril antecipo já a emoção por ver Garcia Pereira e Carmelinda Pereira, do POUS, abordarem a magna questão de como os ossos de Lenine e Mao Tsé-tung (também não está proibido discutir o humanista Estaline...) se comportaram perante a crise financeira internacional ou como reagem quimicamente ao evoluir do estado comatoso de algumas dívidas soberanas. Uma espécie de discussão! Um soberbo pretexto para um escritor, como Umberto Eco em O Nome da Rosa, patrocinar outra grande alegoria investigativa na Idade Média.
Saberemos, também rapidamente, se para Jerónimo de Sousa e Francisco Louçã é mais importante ouvir o representante do MRPP do que os economistas da troika que vão adiantar os salários dos trabalhadores portugueses durante os próximos anos.
Seja como for, vem aí uma semana televisiva delirante, em que a democracia portuguesa afirmará a sua originalidade, e a justiça nos recordará que precisamos mesmo de uma reforma. Ou várias. Até na lei que patrocina esta interrupção voluntária do interesse jornalístico tal como ele é assumido e percebido nos países socialmente evoluídos.
De amanhã a oito dias, a confirmarem-se os resultados das sondagens, também o Bloco de Esquerda vai entrar num processo de debate político. Talvez não mude de coordenador, mas Francisco Louçã vai ter de enfrentar alguns descontentamentos...
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
28/05/11
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