12/01/2011

JOSÉ LEITE PEREIRA


Uma doce vacuidade

Com o país em crise, seria de supor que as eleições presidenciais pudessem ser um excelente tempo de reflexão, de confronto de ideias e de soluções para a crise. Mesmo tratando-se de uma eleição para um cargo vazio de poderes, do qual pouco mais há a esperar do que uma magistratura de influência - ainda que o presidente da República possa demitir o Governo em caso extremo - esta poderia ser uma ocasião a não perder para discutir o país.
Mas esta é, infelizmente, uma eleição com vencedor antecipado, e isso alterou tudo. Em vez da discussão do país, arrasta-se o caso BPN com perguntas que poderiam e deveriam ter sido esclarecidas já em 2009, quando o problema foi levantado. Cavaco continua a não sentir necessidade de responder e transforma uma pergunta óbvia - terá ele tido um tratamento de favor na cotação atribuída às suas acções? - num insulto. Cavaco não consegue disfarçar o incómodo que esta situação lhe provoca, pelas perguntas que lhe fazem pelas trapalhadas em que gente que lhe foi muito próxima se vê envolvida. Mas a questão, até prova em contrário, nada tem de ilegal, não se infere, em momento nenhum, que Cavaco Silva agiu fora da lei. O que falta saber é se o amigo Oliveira e Costa o beneficiou, lhe proporcionou um ganho de 140 por cento. Se, como anteontem dizia o "Sol", Cavaco até vendeu barato, menos se percebe por que não responde e se ofende com a insistência, retorquindo com a infantilidade de que alguém terá de nascer duas vezes para ser mais sério do que ele.
Assim vai o país, nesta doce vacuidade. Tão doce que, mesmo a propósito do mesmíssimo BPN, ninguém questiona o porquê de Oliveira e Costa poder ter sido feito banqueiro, ninguém questiona por que nenhum dos altos responsáveis do país, desconfiou, à época, de nenhuma das operações que conduziram o banco à ruína que o país está agora a pagar. Seria pedir muito ao presidente da República que arrumasse de vez esta questão, respondendo, e se impusesse a si próprio e aos outros concorrentes a discussão do nosso futuro, sem mais demagogia ou verborreia? 

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
09/01/11

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