20/10/2025

LÍGIA SIMÕES

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Vem aí um orçamento
‘nem-nem’

Comedido, mas sem melhor Estado. Minimalista e sem “sem cavaleiros orçamentais”, mas de risco máximo. Para o Governo, o importante é que o Orçamento passe. E quanto mais simples, menos polémico, afastam-se os braços de ferro e os riscos políticos.

Foi entregue o primeiro Orçamento do Estado desta legislatura com um aviso do ministro das Finanças ao país e à oposição: 2026 vai ser “o ano orçamental mais exigente” e “a margem é muita curta”. O excedente de 0,1% estreita as possibilidades a Miranda Sarmento para abrir muito “os cordões à bolsa”, mas nem isso impediu o Partido Socialista de vir a viabilizar o documento.

Este orçamento tem 0,8% do PIB de despesa PRR (2,5 mil milhões) sem correspondência na receita, o que reforça os alertas do Governo no sentido de prudência, rigor e alguma cautela orçamental do lado da despesa. Acresce o exigente contexto internacional, que afeta sobretudo as exportações, que crescem menos que as importações. E_aí reside a principal incerteza.

Assim, não é de estranhar que o OE aponte para a necessidade de crescermos internamente acima dos 3% para compensar o saldo externo negativo, caindo por terra um crescimento da economia em torno de igual fasquia com a revisão em baixa do PIB para 2,3%, menos 0,4 pp que o previsto no programa eleitoral.

É mais um orçamento, acostumado a apanhar boleia do contexto, mas sem rasgo para o alterar. Prefere piscar o olho às várias camadas da população.

Se, do ponto de vista político, não se espera uma reedição do que se passou há um ano, ao esvaziar o documento das medidas mais polémicas como o IRS e IRC, e outras medidas fiscais, numa espécie de Orçamento ‘tax-free’, do ponto da vista da execução, fica novo aviso do Governo: este OE “é o mais difícil de executar”. Assume-se o preocupante aumento da despesa em 4,5%, em contraste com a revisão em baixa do crescimento da economia portuguesa, que pode dificultar o cumprimento da meta para o saldo orçamental.

Ainda que o Executivo rejeite de forma otimista a tese de que está a construir um nível de despesa estrutural difícil de ajustar em caso de aperto, o OE2026 carrega uma mochila de milhares de milhões de euros entre os impactos nas receitas e nas despesas de medidas dos dois anos de Luís Montenegro – menos impostos sobre famílias e empresas, valorização salarial de professores ou polícias. Se alguma coisa falhar no acompanhamento da despesa ou na arrecadação da receita, lá se vai o excedente orçamental próximo de zero, um saldo positivo que o CFP duvida ao projetar o regresso ao défice no próximo ano.

É, pois, um orçamento otimista e sem ambição. De circunstância e com poucos sinais para transformar um Estado cada vez mais pesado e mais caro, objeto de queixas crescentes e serviços à beira da rutura.

Sem economia e margem para as empresas subirem os salários e garantirem mais qualidade de vida aos portugueses, este é um orçamento “nem-nem”. Nem a vida melhora para as famílias, jovens e mais velhos, nem a economia cresce e assegura mais riqueza para todos. Faltam medidas vigorosas para aumentar a capacidade produtiva do país e há uma erosão dos salários líquidos com uma atualização dos escalões abaixo do referencial de aumento salarial para 2026 que não garante a neutralidade fiscal.

Comedido, mas sem melhor Estado. Minimalista e sem “sem cavaleiros orçamentais”, mas de risco máximo. Para o Governo, o importante é que o Orçamento passe. E quanto mais simples, menos polémico, afastam-se os braços de ferro e os riscos políticos.


* Jornalista, sub-directora do "JE"

IN "O JORNAL ECONÓMICO" - 17/10/25     

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