16/03/2025

CÁTIA DOMINGUES

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Dar o Habeas Corpus
ao manifesto

Volta e meia recebemos aquele convite para ir um jantar, um lançamento de livro, uma conferência, e acabamos por recusar porque o mais certo é ser um final de dia aborrecido. Mas como hoje em dia não é qualquer coisa que nos tira de casa, precisamos de sentir que a animação é garantida. E é por isso que devemos valorizar a atuação do grupo Habeas Corpus. Esta semana, este grupo voltou a invadir um evento, desta vez, uma conferência sobre direitos LGBTQIA+, organizada pela Ordem dos Advogados em Lisboa. Tudo o que cheire a esta temática, é certo que este grupo vai marcar presença, como pudemos assistir no lançamento do livro “O Pedro gosta do Afonso” no passado outubro.

Muitas pessoas criticam este coletivo de extrema-direita por ser agressivo, irritante e até perigoso, mas temos de ver o outro lado. É uma maneira de meia dúzia de pessoas desempregadas estarem ativas, porque não podem ser cidadãos com responsabilidades e um emprego, se estão a uma quinta-feira na freguesia de Santa Maria Maior até porque ali para estacionar é um pesadelo. A conferência era “Igualdade em construção: os direitos humanos das pessoas LGBT+” e, como tudo o que está em obras, também aqui apareceram pessoas alheias a mandar bitaites sem lhes ter sido pedida opinião. Quando li que se gritou várias vezes “pouca vergonha” achei que podia ser sobre o que ainda falta fazer para assegurar a igualdade de direitos, mas não. Afinal, era pouca vergonha de se estar a falar sobre isso. Também se classificou o evento como algo que “normaliza a homossexualidade”. Aqui achei arriscado o uso do conceito “normal” por pessoas que passam a vida aos urros, gritos e a ofender quem passa. No final, foram escorraçados do salão nobre da Ordem dos Advogados. O que é no mínimo irónico dado que se trata das mesmas pessoas que abordam a imigração como invasores que deviam ir para a terra deles. Foi exatamente isto que aconteceu a esta minoria. Mas muito a custo, porque os advogados não têm bem jeito para confronto físico. Aliás, tenho ideia que a maioria foi para advocacia exatamente por não ter jeito para andar à porrada.

Pelo que vi, o principal rosto do grupo, o ex-juiz e atual líder do Ergue-te/PNR não estava presente para dar voz pelas famílias “normais”. Foi pena. Imagino que estivesse ocupado a devolver o filho à mãe depois de ter sido acusado de rapto internacional

*Humorista

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS" - 16/03/25

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