27/06/2023

LÍGIA SIMÕES

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Inflação dá bónus fiscal
de 4 mil milhões

Os cofres do Estado vão arrecadar este ano mais de 4 mil milhões de euros em impostos e contribuições devido apenas ao impacto do aumento da inflação - que deverá situar-se nos 5,2%. Qualquer coisa como 11 milhões de euros por dia com a oposição a criticar a imoralidade de o Governo estar a lucrar com a inflação, o Executivo teimou em manter o aumento brutal de IRS sobre as famílias portuguesas durante 2022 e continua a fazer orelhas moucas aos alertas de asfixia fiscal ao fazer, nos últimos anos, alterações do IRS cirúrgicas como o desdobramento de escalões, novos modelos de retenção na fonte e anúncios de IRS jovem.

Recentemente surgiu nova promessa de alívio em sede de IRS. Em abril, aquando da apresentação do Programa de Estabilidade (PdE) 2023-2027, o ministro das Finanças sinalizou uma baixa do peso dos impostos em dois mil milhões. A redução mais expressiva deverá acontecer já no próximo ano, com o Governo a apontar para um alívio de 525 milhões de euros. Curiosamente a mesma ordem de grandeza que beneficiaram os cofres do Estado com a não atualização dos escalões do IRS em linha com a inflação de 2022: foram de 523 milhões de euros de IRS, segundo o Conselho das Finanças Públicas (CFP). Promete assim dar com uma mão o que tirou com a outra com a agravante que no ano passado os contribuintes enfrentaram um nível histórico de inflação nos 7,8%, o valor mais alto desde 1992, aumento dos juros e uma perda do poder de compra sem precedentes.

Pior. No mesmo ano que arrecada milhões com a não atualização dos escalões do IRS adiou decisões para reduzir a fatura fiscal como a do IVA zero sobre o cabaz de bens essenciais numa uma altura em que o poder de compra continuava em queda e o rendimento das famílias estagnado, apesar dos pacotes e pacotinhos de apoio. A descida do IRS deve, por isso, ser a prioridade e não a de engordar os cofres do Estado com a asfixia das famílias e com o IVA que é um imposto cego que não diferencia a quem é aplicado. É certo que o Governo sinalizou que vai desagravar o imposto que recai sobre as famílias até 2027, mas a baixa de dois mil milhões ficou, afinal, condicionada por Fernando Medina, para quando for seguro.

Seria compreensível a aludida segurança se a carga fiscal não estivesse em níveis históricos em Portugal e a estrangular os contribuintes. Desde que António Costa assumiu a liderança do Governo, só em 2019 é que o peso das receitas fiscais e das contribuições sociais desceu de acordo com a série publicada pelo INE, que neste caso não inclui as contribuições sociais imputadas. No PdE entregue a Bruxelas no final de março de 2022, soaram as trombetas de uma redução progressiva da carga fiscal a partir de 2022 para os 34% em 2026, após ter subido para 35,8% em 2021, abaixo dos 36,4% registados no primeiro ano em que António Costa foi primeiro-ministro. O problema é que carga fiscal vai manter-se elevada este ano e nos quatro próximos (em torno dos 37%), depois de ter atingido, afinal, um recorde de 38,2% em 2022. É insustentável esta asfixia dos contribuintes e jackpot fiscal com um único ganhador, o Estado.

* Jornalista, subdirectora do "O JORNAL ECONÓMICO"

IN "NOVO" - 24/06/23

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