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Dançando (Ga)lambada
Corria o ano de 1989 quando Kaoma nos deu o êxito “Dançando Lambada”, cuja letra começava por dizer “Chorando se foi quem um dia só nos fez chorar”, e, quando escrevia este artigo, foi o que me acorreu à memória.
Mas, fora a óbvia piada, a similaridade fica-se mesmo por aqui, uma vez que “quem só nos fez chorar” – leia-se “envergonhar” – continua alegremente no seu ministério, acima de todas as polémicas, segurado por um primeiro-ministro que, por excesso de ego ou mera falta de alternativas, se recusa a fazer o óbvio.
Chegámos ao grau zero, à vergonha alheia e ao lamento “não façam isto ao meu país”.
Não se vê uma obra notável pela sua novidade ou pelos seus princípios de base. A reforma financeira empreendida (ou não) em Portugal não é original, não é revolucionária e não serve o actual estado do país.
Dizer aos portugueses que, apesar da crise mundial, o nosso orçamento é equilibrado de há oito anos para cá, e gabar-se disso, é simplesmente ridículo.
Falta de seriedade nos cálculos orçamentais, orçamentos desequilibrados em série, em que as cativações são uma fórmula mágica para não mostrar a verdade.
Smoke and mirrors, dizem os anglo-saxónicos para caracterizar este tipo de política. It’s all smoke and mirrors, numa lógica à portuguesa de que “isto, com o barulho das luzes, passa”.
E, depois, lemos diariamente acerca do desequilíbrio, da falta de rigor, e, por exemplo, de uma miserabilista execução financeira do famoso PRR, onde mais de 90% das verbas estão por executar.
A nossa história financeira em governos socialistas revela um desequilíbrio tão constante nos 23 anos deste século que já basta para um século inteiro. O défice é uma instituição crónica, presente em cada ministério, secretaria de Estado ou instituição publica, que se agrava à velocidade de 74 milhões ao dia.
A questão é que, dos últimos 27 anos, o PS governou 70% do tempo e condicionou totalmente os outros 30%. E bem sabemos que as palavras “reformas” ou “progressistas” não entram no léxico socialista.
E a acrescentar à nova norma da pura incompetência, à roda-bota-fora nos ministérios e secretarias de Estado e aos escândalos sucessivos, tivemos a cereja no topo do bolo: o assessor que alegadamente foi barricado por colegas dentro do ministério abriu caminho à cotovelada e à bicicletada e levou um computador que lhe estava atribuído, provocando que alguém (que já ganhou o prémio 2023 da falta de noção) convocasse o “James Bond” cá do burgo, de urgência, para ir resgatar o equipamento.
Não por conter informação secreta, quiçá os nomes e moradas dos informadores e espiões a operar em território inimigo, mas as notas de uma reunião da TAP. Aquela que aconteceu-não-aconteceu.
Isto é realmente bater no fundo. E ter o Presidente da República a vir publicamente admoestar o Governo e avisar que vai estar, tipo falcão, a escrutinar tudo, cuidadosamente, daqui para a frente – numa demonstração de total falta de confiança e medo-que-façam-pior, é como condenar o Governo à sanção de termo de identidade e residência. E, já agora, “não saiam do país sem me avisar”.
Nas ruas e nos cafés, onde gosto tanto de ouvir o que as pessoas dizem, o dito “o PS é o Estado e o Estado é o PS” deixou de ser comentado em surdina para passar a ser conversa do dia, por vezes vociferado, sempre lamentado.
O PS, mais uma vez – e já há tantos exemplos desde o 25 de Abril –, resvalou para o autoritarismo, para o amiguismo e para o tudo-me-é-permitido, provocando que as próprias instituições tuteladas pelo Estado-PS já temam atender o telefone e se baralhem nas suas competências e na efectividade do seu trabalho.
E, no meio de tudo isto, o país desnorteia-se com a fragilidade do Governo, a desordem política, a desorganização administrativa, a inflação galopante – sem medidas relevantes para a sua atenuação –, a crise da habitação, a crise da educação, a crise da saúde, a crise da justiça.
E a crise da credibilidade. Já ninguém confia neste governo. Nem os próprios, desconfio.
Mas, também nas ruas, as tais que fazem ganhar e fazem perder e onde a sabedoria popular tanto nos ensina, noto que a História está a destruir a narrativa socialista do “a culpa é do Passos” e que emerge a certeza de que é necessária uma alternativa e voltar a acreditar. É sentir Portugal.
Porque, ao contrário da música que referi no início, em que alegremente se dançava lambada, neste caso e enquanto isto não mudar, quem leva (Ga)lambadas todos os dias continuamos a ser todos nós.
* Presidente da Junta de Freguesia de Sto António
IN "NOVO" - 09/05/23 .
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