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Só sei que nada sei
Portugal está, de facto, cada vez mais na cauda da Europa, mais longe dos países desenvolvidos e instruídos e mais próximo do corno de África e do coração da América Latina.
Nesta semana, a Polícia Judiciária realizou buscas na Câmara de Lisboa no âmbito de um inquérito crime em que os «alvos, por suspeitas de corrupção, são Joaquim Morão, histórico socialista e ex-autarca de Castelo Branco e de Idanha a Nova, e o seu amigo António Realinho, empresário da mesma zona do país, que até já cumpriu pena de prisão por burla», segundo noticiou a TVI.
A informação prestada por fontes judiciais e confirmada por vários meios de comunicação social acrescenta que estão em causa «‘suspeitas de corrupção, participação económica em negócio e falsificação’, numa nomeação para ‘prestação de serviços que foi assinada em 2015’ pelo então presidente da autarquia e atual ministro das Finanças, Fernando Medina».
Mais: «O Ministério Público acredita que o objetivo do esquema visou a angariação de dinheiro em obras públicas, com subornos de empreiteiros, para o financiamento ilícito do PS, através dos chamados sacos azuis».
Perante isto, Fernando Medina veio publicamente negar ter conhecimento de qualquer investigação e garantir que «os processos de contratação da Câmara Municipal de Lisboa eram instruídos pelos serviços competentes para contratação, no cumprimento das normas aplicáveis».
E pronto, siga a marinha como diria o outro.
Não há mais consequências para ninguém. Nem para quem é envolvido, nem para quem é investigado, nem para quem investiga, nem para quem noticia, nem para coisa nenhuma.
Será este o novo normal?
No Brasil ou na Venezuela é. Como em Angola, em Moçambique e tantos outros países africanos emergentes.
Basta olhar para a lista de governantes nomeados pelo Presidente Lula da Silva – e a começar pelo próprio. Tal como, aliás, já acontecia com o seu antecessor, Jair Bolsonaro. São às dúzias, se não às centenas, os processos em que são investigados por corrupção, tráfico de influências ou quejandos.
Não espanta, aliás, que ninguém fique pasmo e que se ache perfeitamente normal que José Sócrates tenha sido convidado para ir assistir à posse do novo Presidente do Brasil – ele, o único primeiro-ministro português que foi preso preventivamente e que até hoje continua sem ser julgado por uma justiça que se deixa enrolar nas suas próprias teias.
Portugal está, de facto, cada vez mais na cauda da Europa, mais longe dos países desenvolvidos e instruídos e mais próximo do corno de África e do coração da América Latina.
Porque está tudo do avesso.
Então não é que o primeiro-ministro e líder socialista queria que os
futuros governantes tivessem que passar pelo crivo prévio do Tribunal
Constitucional e da Procuradoria-Geral da República?
A que propósito?
Bem estiveram os responsáveis do TC e da PGR ao afastarem liminarmente qualquer envolvimento nas escolhas que nada lhes dizem respeito e que de modo algum cabem nas competências que lhes estão constitucionalmente cometidas.
E, vai de lá, acabou o primeiro-ministro por reduzir o mecanismo de escrutínio dos membros do seu Governo a um indecoroso inquérito que só desqualifica quem aceitar sujeitar-se-lhe.
Não é irrelevante que António Costa tenha entretanto vindo dizer que o novo mecanismo (o ridículo questionário) não se aplica a quem já está em funções governativas, alegando que já entregaram as suas declarações de interesses.
Pois sim. Como se não tivesse querido resumir todas as polémicas a ‘casos e casinhos’ e não soubesse que o novo secretário de Estado do Ambiente, Hugo Pires, vendeu a sua empresa há menos de dois anos ao lóbi do lixo, ou que o ministro das Finanças – que nunca sabe de nada – volta a estar envolvido em situações pouco claras.
Quanto a Fernando Medina, perante as notícias que saíram, o mínimo que se exigia é que o próprio imediatamente interpelasse a Procuradoria-Geral da República para que esclarecesse a opinião pública sobre se é ou não suspeito num inquérito crime que envolve corrupção e financiamento ilegal do seu partido.
Não chega disponibilizar-se para ser ouvido e prestar esclarecimentos.
Um ministro não pode aceitar ver a sua honra ou probidade postas em causa pelo Ministério Público sem fundamento.
Se não há suspeitas fundadas por parte do Ministério Público, a PGR não pode deixar a dúvida pairar. Se deixa, o ministro não tem condições para continuar no cargo.
Ora, quando a PGR recusa esclarecer refugiando-se no segredo de justiça...
E quando o Presidente da República acha tudo isto normal...
Já agora, Joaquim Pinto Moreira demitiu-se de vice-presidente da bancada do PSD e da presidência da comissão eventual para a Revisão Constitucional por alegado envolvimento no caso Vórtex e continua deputado?
Mas ninguém se enxerga?
* Jornalista e empresário de comunicação
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