03/05/2022

CÁTIA DOMINGUES

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Caiu-nos a máscara

Mas estamos quase a voltar à vida como a conhecíamos antes de virem parasitas que mudaram o nosso estilo de vida. Calma, malta do Chega, estou a falar do SARS-CoV-2, não estou a falar de imigrantes de países onde a maioria não reza como nós.

Deixou de haver a obrigatoriedade de usar máscaras. Um dos setores mais afetados por esta notícia foi o setor da moda. Aquele resto da bainha dos cortinados vai ter de servir para outra coisa. Vamos deixar de ver bocas com a bandeira de Portugal ou padrões de zebra, ou tigresa para os mais arrojados. Até se fizeram máscaras de cortiça! Para proteger talvez não fossem as melhores, mas para aqueles serões de flutuação em mar aberto, ai para isso foram as ideais. Mas, no geral, é efetivamente uma boa notícia para aquelas pessoas que ficavam com a cana do nariz assada no cinema por causa daquela máscara enrolada na algibeira como um lenço de papel. Foi, no entanto, uma má notícia para pessoas como eu que, dois dias antes da medida compraram um pacote de 100 máscaras esterilizadas. Já estou a pensar nas várias utilizações que posso dar e, digo-vos assim, esta menina não volta a comprar filtros de café tão cedo e sempre que não houver papel numa casa de banho pública, estou safa.

Claro que ainda há locais onde permanece obrigatória, como transportes públicos, não só para proteger do vírus como do odor característico da hora de ponta, e locais onde estejam presentes pessoas especialmente mais vulneráveis. E ainda ontem, como cidadã exemplar que sou, fui visitar uma amiga que terminou com o namorado e fiz questão de seguir à regra o diploma promulgado. Mas a verdade é que ainda se vê muita gente a utilizá-la na rua, o que com o nível de pólen que anda no ar até é capaz de ser uma boa ideia. As vítimas da rinite são reais e os sintomas podem até ser confundidos com uma infeção por covid. E como a covid é uma condição que também afeta as famílias na medida em que o ressonar chega a ser tal que separa pessoas. Da cama para o sofá, é certo, mas separa.

Em abril, fez notícia o facto de nas escolas os alunos terem de começar o 3.oº período ainda com a obrigatoriedade da máscara e muitos especialistas e pais indignados afirmaram que dificultava a aprendizagem e que muitas crianças não conheciam sequer a cara dos professores. O que nem sempre é mau, atenção. Uma vez fui sair à noite, estava a partir a pista ao som de reggaeton e dei de caras com o meu professor de Físico-Química que me olhava com surpresa e um niquinho de desilusão. Nem foi tanto por me ter visto a dar tudo na discoteca, mas porque, para quem dançava tanto a La Gasolina com Pisang Ambon na mão, não percebia como é que chegava ao teste e nem os compostos do etanol sabia. Mas, bom, quando as máscaras foram finalmente dispensadas, a reação de quem nunca tinha visto os seus professores não foi exatamente a esperada. Há relatos de crianças terem começado a chorar assim que viram a cara das suas educadoras. É que, se pensarmos bem, para muitas crianças, os professores eram personagens de banda desenhada cuja metade da cara era feita de pano. "O quê? A professora Alice tem boca e usa aparelho?" Conclui-se que a reversão da medida foi boa para a aprendizagem, mas péssima para a autoestima do pessoal docente. E ainda bem que o SNS anunciou reforço no investimento para a saúde mental.

* Humorista

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS" - 01/05/22.

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