23/03/2022

PEDRO IVO CARVALHO

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Sejam muito bem vindos

Não é fácil distinguir clarões de luz por entre as trevas da guerra, especialmente quando o palco que se pretende iluminar é uma Europa que está, de novo, a enfrentar uma prova de esforço para a qual não estava preparada. Mas essa luz existe e vemo-la espraiada na generosidade das nações e dos cidadãos que, de um dia para o outro, nos fizeram esquecer que este era, não há muito tempo, o continente que segregava refugiados pela sua proveniência, patrocinando uma mercearia diplomática demasiadas vezes paga em vidas humanas. A forma como essa evolução aconteceu, em países como a Polónia, a Hungria e a Grécia, que fizeram vista grossa a sírios e iraquianos, é merecedora de elogio.

A Europa não respondeu à invasão russa com as armas que os ucranianos pediam, mas abriu os braços a um exército cabisbaixo e exangue de seres humanos que se viram privados de um teto e de um futuro. As histórias de gente abnegada que largou tudo e se plantou nas fronteiras para ajudar, que reuniu toneladas de alimentos, que se disponibilizou para receber famílias, são a evidência inabalável de que o estafado primado europeu da solidariedade e da integração não é um chavão poético quando serve verdadeiramente um propósito. Quando serve os europeus. Sejam eles do Norte, do Centro ou do Sul. Sejam eles membros ou não da União Europeia. Aquilo que a Europa não pôde dar à Ucrânia na aceleração do processo de adesão ao clube dos 27 está a compensar numa retaguarda humanitária sem precedentes na história recente. Será sempre pouco quando aquilo que nos condiciona os movimentos são as bombas e as sirenes, mas podemos estar certos de que, para as próximas gerações de ucranianos que crescerem na Europa do pós-guerra, esse salvo-conduto foi a melhor garantia de que podem sentir-se europeus de corpo inteiro. Por isso, sejam muito bem-vindos.

* Director-adjunto

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS" - 19/07/22.

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