09/05/2021

ISABEL MOREIRA

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Corrupção ou o debate

 quase impossível

Pretender que houve, há ou haverá alguma relutância por parte do PS em combater a corrupção é desmentido pela História e pelo presente, resultando a façanha de uma postura conspirativa amiga do pior que vai acontecendo à política

Parece a famosa luta com um porco. Quem quiser debater com seriedade o tema da corrupção tem de estar preparado para a enorme probabilidade de não ser ouvido. O ambiente feliz para populistas está instalado. Não se ganha em explicar que o maior problema da democracia portuguesa não é a corrupção, porque vivemos tempos em que a perceção do facto substitui o facto, desde logo na agenda mediática. A pronúncia de um ex-primeiro-ministro como que libertou todos os pudores que rapidamente se transformaram em concursos de a-ver-quem-é-mais-contra-a-corrupção (e de dedos em riste contra o PS). Do PSD ao BE, não houve quem resistisse à perceção de que os políticos são todos putativos corruptos, e toca a bater no peito com o enriquecimento ilícito, prometendo-o para já, fazendo crer que tal coisa é o remédio contra a corrupção, que é, imagine-se, o que faltou na Operação Marquês, e explicando que quem a travou foi, claro, o PS, esse partido suspeito.

Como sair da lama?

Com a verdade.

O quadro jurídico português em matéria de combate à corrupção é reconhecidamente bom. Nunca me faltaram palavras para reconhecer obra alheia, pelo que me custa que se finja não saber que marcos como a quebra do sigilo bancário e fiscal nas fases de inquérito, instrução e julgamento de vários crimes, entre os quais corrupção passiva, peculato e branqueamento de capitais, a possibilidade de controlo de contas bancárias por despacho do juiz, o mecanismo de arresto e de perdas de bens a favor do Estado, a criação do conceito de “pessoas politicamente expostas”, a criação do crime de recebimento indevido de vantagem ou a alteração do prazo de prescrição dos crimes de corrupção e de recebimento indevido de vantagem para 15 anos, entre tantos exemplos, são património do PS.

Pretender que houve, há ou haverá alguma relutância por parte do PS em combater a corrupção é desmentido pela História e pelo presente, resultando a façanha de uma postura conspirativa amiga do pior que vai acontecendo à política. Para quem se quer manter num mundo balizado pelo Estado de direito democrático, para quem recusa um mundo pós-político em que a realidade passa a ser irrelevante, o combate à corrupção não se faz com um corte com o passado, como se não soubéssemos que não somos quem somos se anunciarmos medidas legislativas em busca de empatia semântica, ainda que sabendo da sua inconstitucionalidade.

Era importante que quem anda na política soubesse explicar que o enriquecimento ilícito já é punido. O que andamos a discutir é o aperfeiçoamento de legislação já existente. E cá estarei para a crítica. E também devia ser explicado que não vamos aprovar a cereja que faltava para apanhar de vez os corruptos. Estamos a debater uma estratégia e uma legislação de aperfeiçoamento de um quadro de combate à corrupção que já é, atualmente, bom.

E sim, com enorme contributo do PS. O PS tem estado sempre presente nesta matéria. Não aparece do nada quando começam a gritar que “anda tudo a gamar”.

* Deputada independente à A.R. (PS)

IN "VISÃO" - 06/05/21

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