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Curar feridas,
sem romantismo
Mais de 300 mil alunos do Ensino Secundário (a que se junta um número imprevisível de estudantes do Superior) regressam amanhã à escola, 87 dias após a última aula presencial.
São quase três meses sem interação direta em contexto de sala, sem socialização, sem conversas imediatas e isentas de mediação tecnológica. O que espanta, na atual situação epidemiológica do país, é que algumas vozes insistam em semear receios e atribuir à escola riscos que os números de infeções e surtos têm permitido recolocar na sua verdadeira dimensão.
Só o tempo dirá o que esta pandemia representou para os mais novos. Não apenas na educação, mas sobretudo no seu crescimento social e emocional e na crença que temos quando somos jovens de que todas as possibilidades se abrem infinitamente à nossa frente. Temos vivido subjugados pelo medo, coletivamente, e é difícil prever até que ponto sobrecarregámos as novas gerações com o nosso próprio pessimismo.
Na renovação de mais um estado de emergência, o presidente da República alertou que a reconstrução social será mais demorada do que a económica. Dificilmente, em qualquer caso, se poderá perspetivar uma coisa sem a outra. A crise profunda em que mergulhámos, e que ainda está longe de atingir o pico, agravou as desigualdades a todos os níveis. Virar a página implica atacar as causas, repensar modelos de organização da economia e da sociedade, aproximar as pessoas.
Quando a pandemia nos obrigou a confinamentos que nos confrontaram com a total incerteza e insegurança do que julgávamos ter por adquirido, ouviram-se prognósticos de que sairíamos desta crise mais coesos e conscientes da nossa fragilidade. Sem ingenuidade, temos de admitir que a coesão diminuiu e que em muitos casos o desespero, o medo e a falta de apoio nos tornaram mais desconfiados e focados no nosso próprio umbigo.
É urgente curar feridas. Uma tarefa que exige, antes de mais, políticas públicas ambiciosas, mas vai muito além disso. Exige que cada um de nós saia das sucessivas bolhas que foi criando no último ano e que aqueles que saíram preservados financeiramente saibam olhar para o lado, com limpidez. Sem o empenho de todos, cada um à sua escala, a reconstrução será sempre uma miragem.
* Directora
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS" - 18/04/21
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