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Os chicos-espertos da pandemia
Não querendo ser moralista, importa lembrar a
quem não quer saber que não devem brincar com as vossas vidas. E não
brinquem, principalmente, com as vidas dos outros.
Uma senhora questionava os seus
seguidores no Facebook sobre como conseguiria continuar com a sua vida
“normal” agora que tinha dado positivo num teste à Covid-19, uma vez que
não podia sair de casa. Alguém lhe respondeu que tinha dado positivo e
que, mesmo assim, tinha continuado a ter uma vida normal conseguindo,
inclusive, levar o seu filho à escola. À pergunta mais do que óbvia “mas
como?” a senhora respondeu: simples, não disse a ninguém que estava
infetada.
Mais tarde, já este ano, uma colega contava-me que o
marido estava a embarcar para Angola, a partir do aeroporto de Lisboa,
pouco tempo antes de Angola fechar a ligação de voos oriundos de
Portugal. O senhor acabou por não embarcar porque o teste do
laboratório, a confirmar que estaria negativo (tinha um teste negativo
com 74 horas), não chegou a tempo.
Mas, e este mas é
assustadoramente cómico, ao seu lado estava uma família, constituída por
cerca de 10 pessoas, com teste à Covid-19 com menos de 72 horas e um
detalhe: todos tinham dado positivo ao teste. Resultado? A funcionária
do aeroporto gritava-lhes que não podiam estar ali e que teriam de sair.
Aconteceu alguma coisa? Encostaram-se a uma parede, na zona onde se
encontravam, e por ali ficaram.
Nas redes sociais propaga-se a
história do profissional de saúde que andava às compras e reconheceu um
paciente que tinha dado positivo. Dirigiu-se ao segurança e pediu que
solicitasse, ao microfone, a quem estava infetado que saísse
imediatamente do supermercado pois iriam chamar as autoridades.
Prontamente, apresentaram-se umas 10 pessoas à saída.
Há uns dias,
também soube que havia pais a descobrir em grupos de WhatsApp – depois
de uma insistência que, cívica e conscientemente, deveria ser
desnecessária – que vários miúdos das salas de aula dos filhos (e que
convivem diária e diretamente uns com os outros) estavam, afinal,
positivos. Assim do nada, descobriam.
Teriam dado positivo (muito)
poucos dias antes do Governo ter decretado o encerramento das escolas
em janeiro. O normal seria comunicarem à escola para depois a direção do
estabelecimento comunicar aos pais das crianças da sala em questão. Da
escola nada. Dos pais, apenas uns “melhoras rápidas” e que “fiquem todos
bem”. Aparentemente, ninguém fica preocupado com a propagação.
Festas
privadas, malta a beber umas minis à porta fechada em cafés,
cabeleireiros e barbeiros a atenderem à porta fechada e muitos outros
que, em plena pandemia, continuam a acontecer. Não estou a ignorar quem
tenta, em tempos como estes, com falências a acontecerem, lutar por
aquilo em que investiu. Mas há um detalhe. Na pandemia, a mentira e a
ocultação têm perna curta: podem fugir à polícia, aos impostos… a quem
quer que seja. Mas não fogem ao vírus. E com eles levam, muitas vezes,
outras pessoas.
Por último, os chicos-espertos que escolhem
funcionários de pastelarias, filhos de autarcas, todos excluídos dos
chamados grupos de risco prioritários, para tomarem vacinas que seriam
para deitar fora (?!), retirando-as assim a quem delas realmente
precisa.
Em comum, todos estes exemplos – haverá muitos mais, têm
esta comédia negra, que acontece no cenário pandémico que vivemos – são
inacreditáveis pela liberdade com que florescem à luz do dia, e
gravíssimos, pelo ânimo leve com que algumas pessoas continuam a fazer o
que bem lhes apetece sem consequências de maior.
Infelizmente,
mais para quem cumpre as regras e é apanhado no meio destes
chicos-espertos do que para quem não quer saber, o vírus não se deixa
enganar. E já mostrou que funciona como uma roleta russa: não interessa
se é atleta de alta competição, novo ou velho, com ou sem doenças. Temos
centenas de pessoas a morrerem diariamente. Muitas que, à partida, não
seriam “elegíveis” para morrerem por causa deste vírus. Mas morreram!
Não
querendo ser moralista, importa lembrar que não devem brincar com as
vossas vidas. E não brinquem, principalmente, com as vidas dos outros.
* Diretor de Comunicação e Marketing da Whitestar Asset Solutions
IN "O JORNAL ECONÓMICO" - 03/02/21
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Uma senhora questionava os seus seguidores no Facebook sobre como conseguiria continuar com a sua vida “normal” agora que tinha dado positivo num teste à Covid-19, uma vez que não podia sair de casa. Alguém lhe respondeu que tinha dado positivo e que, mesmo assim, tinha continuado a ter uma vida normal conseguindo, inclusive, levar o seu filho à escola. À pergunta mais do que óbvia “mas como?” a senhora respondeu: simples, não disse a ninguém que estava infetada.
Mais tarde, já este ano, uma colega contava-me que o marido estava a embarcar para Angola, a partir do aeroporto de Lisboa, pouco tempo antes de Angola fechar a ligação de voos oriundos de Portugal. O senhor acabou por não embarcar porque o teste do laboratório, a confirmar que estaria negativo (tinha um teste negativo com 74 horas), não chegou a tempo.
Mas, e este mas é assustadoramente cómico, ao seu lado estava uma família, constituída por cerca de 10 pessoas, com teste à Covid-19 com menos de 72 horas e um detalhe: todos tinham dado positivo ao teste. Resultado? A funcionária do aeroporto gritava-lhes que não podiam estar ali e que teriam de sair. Aconteceu alguma coisa? Encostaram-se a uma parede, na zona onde se encontravam, e por ali ficaram.
Nas redes sociais propaga-se a história do profissional de saúde que andava às compras e reconheceu um paciente que tinha dado positivo. Dirigiu-se ao segurança e pediu que solicitasse, ao microfone, a quem estava infetado que saísse imediatamente do supermercado pois iriam chamar as autoridades. Prontamente, apresentaram-se umas 10 pessoas à saída.
Há uns dias, também soube que havia pais a descobrir em grupos de WhatsApp – depois de uma insistência que, cívica e conscientemente, deveria ser desnecessária – que vários miúdos das salas de aula dos filhos (e que convivem diária e diretamente uns com os outros) estavam, afinal, positivos. Assim do nada, descobriam.
Teriam dado positivo (muito) poucos dias antes do Governo ter decretado o encerramento das escolas em janeiro. O normal seria comunicarem à escola para depois a direção do estabelecimento comunicar aos pais das crianças da sala em questão. Da escola nada. Dos pais, apenas uns “melhoras rápidas” e que “fiquem todos bem”. Aparentemente, ninguém fica preocupado com a propagação.
Festas privadas, malta a beber umas minis à porta fechada em cafés, cabeleireiros e barbeiros a atenderem à porta fechada e muitos outros que, em plena pandemia, continuam a acontecer. Não estou a ignorar quem tenta, em tempos como estes, com falências a acontecerem, lutar por aquilo em que investiu. Mas há um detalhe. Na pandemia, a mentira e a ocultação têm perna curta: podem fugir à polícia, aos impostos… a quem quer que seja. Mas não fogem ao vírus. E com eles levam, muitas vezes, outras pessoas.
Por último, os chicos-espertos que escolhem funcionários de pastelarias, filhos de autarcas, todos excluídos dos chamados grupos de risco prioritários, para tomarem vacinas que seriam para deitar fora (?!), retirando-as assim a quem delas realmente precisa.
Em comum, todos estes exemplos – haverá muitos mais, têm esta comédia negra, que acontece no cenário pandémico que vivemos – são inacreditáveis pela liberdade com que florescem à luz do dia, e gravíssimos, pelo ânimo leve com que algumas pessoas continuam a fazer o que bem lhes apetece sem consequências de maior.
Infelizmente, mais para quem cumpre as regras e é apanhado no meio destes chicos-espertos do que para quem não quer saber, o vírus não se deixa enganar. E já mostrou que funciona como uma roleta russa: não interessa se é atleta de alta competição, novo ou velho, com ou sem doenças. Temos centenas de pessoas a morrerem diariamente. Muitas que, à partida, não seriam “elegíveis” para morrerem por causa deste vírus. Mas morreram!
Não querendo ser moralista, importa lembrar que não devem brincar com as vossas vidas. E não brinquem, principalmente, com as vidas dos outros.
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