27/01/2021

DAVID BERNARDO

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 Um filme pornográfico 

não é o mesmo que sexo

 Há que repensar a experiência do trabalho, educação e comércio e de outras indústrias de raiz, baseadas nos objetivos reais e alcançá-los com as tecnologias disponíveis, em vez de tentar replicar o velho, de forma digital.

Uma aula em Zoom não é o mesmo que uma aula presencial. Se antes sofríamos com powerpoints que não terminavam, agora a nova ferramenta de tortura são as videoconferências infindáveis. Crianças que choram, pessoas com camisa, mas com calças de pijama, o cão que ladra, e tudo isto com uma má iluminação, passaram a fazer parte do nosso dia a dia.

A típica falta de preparação, tanto das pessoas como de muitas empresas, para a mudança, leva a que, perante um impacto externo inesperado (como o fecho dos escritórios pelo covid), se empurre o pêndulo para o outro extremo. Antes nem queriam saber de trabalho remoto, agora.... “o mundo vai ser completamente virtual”, mas sem pensar bem no que isso significa, ou como se faz. A covid veio acelerar (felizmente) um conjunto de tendências e tecnologias que já eram óbvias. Mas o ser humano só muda, normalmente, por duas razões: dor ou prazer extremo. O digital apresenta um conjunto enorme de vantagens, mas não é perfeito. E para ser realmente bem aproveitado, mais importante que usar novas ferramentas, há que pensar na experiência que vem apoiar a satisfação de um cliente.

O caso da educação é provavelmente um dos mais óbvios a reinventar. A educação continua a basear-se em metodologias que não se adequaram ao longo dos séculos, e agora o que fizemos foi meter câmaras sobre essa experiência. Claro que a eficácia vai ser muito inferior. Para começar, uma sala de aula atual segmenta os alunos de uma forma simples, idade e interesse (ex.: tenho 20 anos e quero estudar arquitetura), mas ignora completamente o nível de conhecimento ou metodologia de aprendizagem de cada aluno. Qual é o objetivo das aulas? Aprender da forma mais eficiente para cada aluno e promover novas ideias? Então há que desenhá-las para isso. Por exemplo, utilizando educação adaptativa em que o aluno vai sendo avaliado continuamente e recebe conteúdos adequados ao seu nível até chegar ao desejado.

Regressando ao trabalho, o que se menciona como “futuro do trabalho” e “trabalho remoto” são diferentes, mas muitas vezes confundidos. “Trabalho remoto” é trabalho à distância. O “futuro do trabalho” tem como objetivo maximizar a experiência e a produtividade com a melhor combinação possível. O contacto e a comunicação corporal ainda não se conseguem substituir. A Apple não gastou 5 mil milhões de dólares num edifício de escritórios, concebido como redondo, apenas por capricho. Foi por acreditar na importância do contacto entre as pessoas e maximizar os encontros entre as várias áreas da empresa. Da mesma forma que o trabalho remoto (estou neste momento numa rede em Tulum, no México) vai aumentar, mas não vai ser a única versão, e uma combinação dos dois pode ser ótima.

Como diz o povo, às vezes sábio, “no meio está a virtude”. Sim, cada vez mais o virtual vai ter mais sentido, mas não como o estamos a fazer. O regresso ao que era normal já não tem sentido. Porque não aproveitar as mudanças excelentes que aconteceram neste período? Há que repensar a experiência do trabalho, educação e comércio e de outras indústrias de raiz, baseadas nos objetivos reais e alcançá-los com as tecnologias disponíveis, em vez de tentar replicar o velho, de forma digital. Não queremos mais filmes de baixo budget com maus atores e sem iluminação, venha o trabalho hollywoodesco.

 * Actualmente o professor de ecommerce e marketing digital na Nova School of Business Lisboa e na universidade Tec de Monterrey na cidade do México.

 IN "JORNAL DE NEGÓCIOS" - 27/01/21

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