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amadorismo e profissionalismo
A questão é legítima e qualquer um de nós poderá colocá-la: será que o
dinheiro é um problema no desporto? Nas práticas desportivas como o
futebol, o basquetebol, o ténis, o golfe, as corridas de automóveis, o
ciclismo, entre outras, podemos pensar que sim. Quanto maior for o
cálculo económico desta atividade humana, podemos dizer que maior é o
risco de fazer desaparecer a cultura desportiva, caraterizada pela
incerteza fundamental produzida pela competição entre iguais e pela
lógica de identificação que liga uma equipa ou um clube a um determinado
território.
A dopagem, a corrupção e a violência não são fenómenos
novos no desporto. No entanto, eles agravaram-se nas últimas décadas. O
olimpismo constrói-se no final do século XIX contra o nascente
profissionalismo e contra as derivas pressentidas do
desporto-espetáculo. Ora, o dinheiro permite engendrar uma vantagem, não
permitindo organizar a competição entre dois atletas iguais: o
profissional recebe um rendimento que lhe permite treinar, enquanto o
amador trabalha para ganhar a vida ou ocupa-se de outras atividades. A
presença do dinheiro choca a moral aristocrática desse tempo, que
considera o desporto como uma atividade desinteressada e de alto valor
educativo.
O olimpismo pretende construir, assim, uma contra-sociedade,
que seria, no fundo, a imagem idealizada da sociedade moderna. Na
realidade, ele coloca em prática um sistema desportivo onde a igualdade é
entre os melhores, traduzindo-se pelo caráter socialmente exclusivo dos
clubes e as interdições feitas aos operários de entrar nas associações
desportivas. E isso leva à separação do desporto amador e do desporto
profissional. Esta filosofia é sustentada ao mesmo tempo que a
democratização do desporto ao longo do século XX, pela intervenção, em
nome de diversas conceções de interesse geral, dos Estados, dos
municípios ou das igrejas. A partir dos anos 1930, e depois a Guerra
Fria, a competição política entre os totalitarismos e as democracias,
assim como a vontade de colocar em evidência a grandeza nacional graças
ao desporto, concorre para o desenvolvimento do desporto-espetáculo e da
profissionalização dos seus atores, esbatendo as fronteiras que parecem
evidentes entre amadorismo e profissionalismo.
* Sociólogo,
Doutor em Educação Física e Desporto, Ramo Didática. Investigador
Integrado do Centro de Estudos Interdisciplinares em Educação e
Desenvolvimento (CeiED), da Universidade Lusófona de Lisboa
IN "A BOLA"
05/08/20
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