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IN "O JORNAL ECONÓMICO"
30/06/20
Covid-19 e
transportes públicos:
o que sabemos?
Os problemas estruturais associados ao aumento dos casos de Covid-19 estão identificados: pobreza, precariedade e falta de transportes públicos.
Face ao
aumento do número de infetados na região de Lisboa e Vale do Tejo, o
Governo decidiu, na passada semana, dividir o país em três, com 19
freguesias da área metropolitana de Lisboa a ficarem em estado de
calamidade, incluindo o “dever cívico de recolhimento domiciliário”.
Os
especialistas dividem-se quanto às causas destes maus resultados na
região de Lisboa, enquanto os profissionais de saúde já exigiram maior
coordenação no combate à pandemia na capital. Mas talvez não fosse má
ideia prestar atenção ao aviso do ex-ministro do Trabalho, Paulo Pedroso:
“Quando o vírus desceu na escala social, a abordagem começou a mudar
também no plano comunicacional face à doença. A compaixão pelos
atingidos está a ser substituída pela sua culpabilização.”
Contudo,
quem não procurou respostas simplistas, como os jovens e as festas, viu
a emergência de problemas estruturais associados ao aumento dos casos
de Covid-19: pobreza, precariedade e falta de transportes públicos. Isto
anda tudo ligado.
Falemos então do problema dos transportes públicos, sendo que há três coisas que sabemos.
1) A falta de transportes públicos foi uma escolha
Têm-se
multiplicado os vídeos nas redes sociais de comboios e metros apinhados
de pessoas que não têm como cumprir o distanciamento social. A regra do
máximo de dois terços da capacidade simplesmente não está a ser
cumprida e estas são as pessoas que se mantiveram a trabalhar durante
todo o período da pandemia, muitas das quais vivem nas 19 freguesias
mais afetadas.
No entanto, só na semana passada é que a respetiva
autoridade decidiu reforçar para 90% a oferta de transportes que até
aqui tinha funcionado a 50% da capacidade normal. A opção foi deixar que
as pessoas viajassem em autocarros à pinha. No caso dos comboios ou do
metro é ainda pior, pois não vai haver reforço. Razão pela qual o Bloco
de Esquerda chamou o Governo ao Parlamento já esta quarta-feira para
esclarecer esta matéria.
2) O automóvel individual não é solução
Os
cientistas já estabeleceram uma relação direta entre a poluição do ar e
a Covid-19. Os dados indicam que as pessoas que vivem em zonas com mais
poluição atmosférica têm mais probabilidade de apanhar e de falecer da
doença.
Assim, quem achar que a solução para fugir à pandemia é a
aposta no carro está totalmente enganado. Essa via só aumentaria a
poluição do ar, deixando-nos mais vulneráveis a esta doença e a todas as
doenças respiratórias associadas à má qualidade do ar. Importa lembrar
que a 2ª Circular junto a Telheiras, o Parque das Nações, o Cais do
Sodré e a Av. da Liberdade tinham níveis de poluição do ar muito
superiores ao permitido pela legislação.
3) Há soluções, mas são fora da caixa
Há
uma primeira solução para o problema: investir nos transportes
públicos. Convém não esquecer que, durante a troika, as empresas de
transporte público foram financeiramente asfixiadas para serem vendidas e
que ainda se debatem com falta de recursos. Mesmo depois da redução do
preço dos passes, os níveis de financiamento público dos transportes
oscilam entre os 25% e os 30%, quando em cidades como Madrid, Paris, ou
Barcelona estão nos 45%-60%. Não há solução sem investimento público.
O
que também tem sido feito por toda a Europa é a aposta em ciclovias. No
Reino Unido há mais de 40 autarquias que têm apostado em ciclovias pop-up, que permitem a quem não andava de bicicleta passe a ter uma alternativa segura e confortável aos transportes públicos.
Em Lisboa, a Câmara Municipal fez o mesmo, tendo anunciado mais de 95 quilómetros de ciclovias pop-up
até 2021 e um programa de apoio à compra de bicicletas no valor de 3
milhões de euros. É uma medida sensata, que contribui para a redução da
poluição, reduz a pressão sobre os transportes públicos e melhora a
mobilidade na cidade.
Em vez de culparmos as pessoas que têm de ir
trabalhar é melhor observarmos os factos sociais que as expõem aos
riscos da pandemia. Talvez assim encontremos melhores respostas e menos
ódio social.
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
30/06/20
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