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* Directora
IN "VISÃO"
23/07/20
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No money for the boys
São 58 mil milhões de euros para injetar na economia. É dinheiro que se veja – esbanjá-lo é fácil, investi-lo bem é que exige visão e estratégia
Foram os frugais, os forretas e os ceguetas, liderados pela Holanda,
contra os despesistas, os solidários e os visionários, liderados pelo
euro franco-alemão. E ao quinto dia fez-se luz. As duas alas com ideias
bem distintas do que deve ser a Europa encontraram-se algures a meio
caminho, num acordo tirado a ferros que só se alcançou já passava das 4h
da manhã do quinto dia de negociações. Ficou para a História este
Conselho Europeu duríssimo (as segundas rondas negociais mais longas de
sempre), e se não se conseguiu aprovar a desejada bazuca, veio de lá um
poderoso lança-foguetes de longo alcance.
Pela primeira vez foi aprovado um instrumento específico de
recuperação económica, um Fundo de Recuperação com 750 mil milhões de
euros, dos quais 390 mil milhões são a fundo perdido (e não os 500 mil
milhões inicialmente propostos). Portugal terá disponíveis 45 mil
milhões de euros nos próximos sete anos, 15,3 mil milhões de euros em
transferências a fundo perdido e 29,8 mil milhões de euros em subsídios
do orçamento da UE até 2027. E ainda saiu da cartola um programa
específico para a região do Algarve, suportado por 300 milhões de euros
adicionais na área da Coesão.
Um pequeno grande detalhe ficou inscrito para fazer a vontade aos
frugais, que conseguiram também um desconto nas suas contribuições: a
forma como é gasto terá de ser fiscalizada mediante “critérios” a
definir, para evitar uma má utilização dos fundos. Compreende-se: quem
dá quer ver se é bem gasto, quem estende a mão aceita as regras.
Eis agora o busílis da questão: vem aí muito dinheiro para Portugal e
é preciso saber o que fazer com ele. Se pensarmos nestes 45 mil milhões
e lhes somarmos os 12,8 mil milhões de euros que estão por executar do
atual quadro comunitário que têm de ser executados até 2023, são 58 mil
milhões de euros para injetar na economia. É dinheiro que se veja –
esbanjá-lo é fácil, investi-lo bem é que exige visão e estratégia.
Vale a pena olhar para a História e para o dinheiro da CEE que em
tempos chegou a rodos. Entre 1986 e 2011, Portugal recebeu 81 mil
milhões de euros em fundos estruturais e de coesão, o que corresponde a
nove milhões de euros por dia que vieram de Bruxelas. Grande parte deste
dinheiro foi gasta por Cavaco Silva em betão e infraestruturas, de que o
País sem dúvida necessitava. Foram determinantes para o turismo e o
desenvolvimento económico. A questão, como sempre, são os exageros, os
amiguismos e os abusos. Temos uma rede rodoviária megalómana, e houve
muito desperdício, desvio de dinheiro e falta de controlo no Fundo
Social Europeu, sobretudo no início.
Com a visão estratégica que não foi
além do alcatrão, podíamos ter feito mais e melhor.
Cumpre agora investir bem esta verba enorme que vai chegar-nos, e
apostar em gastos que terão retorno. O programa de António Costa Silva
apresentado esta semana faz luz sobre o que pode vir a ser o caminho:
digitalização, reindustrialização, economia verde e descarbonização, e
uma nova aposta em infraestruturas, com um novo aeroporto, um TGV e o
alargamento da rede do metro na Zona Metropolitana de Lisboa.
Tudo ideias lúcidas, diria que mais ou menos evidentes. A diferença
estará na execução. Temos de aprender com os erros do passado. Não pode
haver megalomanias nem money for the boys – as atribuições e
adjudicações terão de ser criteriosas e as despesas certeiras. E isso,
parecendo que não, é deveras complicado.
* Directora
IN "VISÃO"
23/07/20
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