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* Presidente das Mulheres Socialistas/FAUL
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
17/04/20
Os Direitos Humanos
invisíveis nos tempos
de Covid- 19
As Nações Unidas lançaram um relatório sobre o impacto da pandemia
de Covid-19 sobre os avanços alcançados, durante décadas, para a
igualdade de género.
O documento revela que a pandemia pode
reverter conquistas sobre os direitos das mulheres e pede que a
liderança e a contribuição feminina sejam o centro dos esforços de
recuperação contra o novo coronavírus.
O secretário-geral da
ONU, António Guterres, em mensagem sobre este tema ressaltou que cerca
de 60% das mulheres em todo o mundo trabalham na economia informal,
recebendo salários inferiores e sob grande risco de cair na pobreza
extrema.
Começam a ser preocupantes e até angustiante a perda
de milhões de postos de trabalho pelas mulheres, sobre as quais incide
igualmente (por falta de partilha) as tarefas de cuidar das crianças e
dos idosos, em trabalhos não-remunerados.
Existe ainda outra
realidade penumbra para o qual nos alerta este relatório da ONU, quando
evidencia que a pandemia e as medidas de confinamento estão a traduzir-
se num aumento nos casos de violência doméstica.
Os dados
oficiais revelam que somente no ano passado, uma em cada cinco mulheres
foi vítima de violência. E muitos dos agressores estão em casa por causa
da quarentena, com todos os riscos e perigos que essa presença em clima
de tensão acrescida pode gerar.
Estão assim a surgir novos perigos, face a esta novo paradigma para o
qual todos devemos estar atentos. Os pedidos de apoio, quer de vítimas
de violência de género, quer de violência contra as crianças, registou
subidas nos países mais atingidos como na China, em França ou no Reino
Unido.
Em Portugal, neste domínio, o Governo está a reforçar a
capacidade de resposta da Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência
Doméstica (RNAVVD), para fazer face às consequências do isolamento
social imposto para combater a pandemia da Covid-19.
Com efeito,
mais duas estruturas temporárias de acolhimento de emergência, que vão
dispor de quartos de isolamento, com vaga para mais 100 pessoas serão
uma enorme mais-valia. Estes dois locais de acolhimento juntam-se,
assim, aos 65 já existentes e em pleno funcionamento.
Nestas
estruturas será implementado um plano de contingência e de atuação, que
inclui a "criação/reforço dos meios de comunicação/atendimento à
distância; reforço do atendimento telefónico; monitorização das
situações em acompanhamento com maior regularidade; designação de uma
equipa para situações e pedidos de urgência; atendimento presencial em
situações urgentes, com equipas em rotatividade e articulação estreita
com outros serviços e autarquias para responder a necessidades urgentes
de acolhimento".
São muitos os desafios que a pandemia do novo
coronavírus impôs aos sistemas de saúde e da educação de todo o mundo,
provocada por um vírus que apesar de não olhar a geografias, na verdade
não atinge todos os países e povos da mesma maneira.
Em África são já diários os reportes do aumento da fome e da perda de
vidas humanas até no âmbito da saúde materna, com mulheres a morrer em
trabalho de parto por não conseguirem aceder ao hospital como no Uganda.
Igualmente nos campos de refugiados, designadamente na Grécia,
são muitos os dramas dilacerantes que se vivem, que já existiam antes
da crise sanitária e agora avolumaram-se. À vulnerabilidade a que
estavam sujeitos soma-se agora o isolamento e todos os custos que este
transporta para aqueles "que dormem ao relento em lençóis de chuva e
camas de vento ".
Com a interrupção dos programas de acolhimento,
a suspensão dos procedimentos de asilo e a quarentena, os refugiados na
Europa estão assim mais expostos e frágeis do que nunca à nova pandemia
de coronavírus.
O que temos sabido ultimamente sobre estes seres
humanos tão frágeis e vulneráveis, em particular sobre as mulheres e
crianças refugiadas? Sublinhe-se que existe ainda um número muito
alargado de menores desacompanhados, que estão totalmente desprotegidos.
Sobre estes "invisíveis "não há boletins diários, fogem às estatísticas
e deixaram de ter a lente da comunicação social.
Apesar de
estamos focados nas nossas próprias frentes de luta, temos que fazer um
esforço para sair do casulo individual e da bolha dos nossos
territórios.
Com efeito, urge tratar desse vírus maior que é a indiferença perante
a fome, perante os conflitos armados e face a outras doenças que matam
furiosamente e para as quais as vacinas existentes há muitos anos que
teimosamente não chegam a quem delas mais precisa.
Na verdade,
precisamos de inverter todas as desigualdades e em particular a
desigualdade entre homens e mulheres que em momentos de crise de larga
escala provoca sempre inaceitáveis recuos nos direitos das mulheres.
Essas
crises são também uma ameaça na proteção das crianças, que longe das
escolas por estas estarem encerradas em 188 Países no mundo, estão
também mais longe do olhar atento dos seus professores e educadores.
Preocupamo-nos
com as ruas desertas, mas devemos acima de tudo preocuparmo-nos com os
líderes mundiais desertos de alma. Infelizmente temos muitos maus
exemplos dessas frias lideranças a pairar em diversas latitudes.
Os
direitos humanos e a proteção internacional não podem ficar de
quarentena, há que os defender diariamente sem tibiezas, sem recuos, sem
bolhas de isolamento que não nos deixam ver as atrocidades que estão a
ser cometidas.
Afinal, se à luz da Declaração Universal dos Direitos Humanos, "todos
os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos,
dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em
espírito de fraternidade" então mesmo em tempos de pandemia, impõe-se
que possamos agir em conformidade com a letra e espírito dessa
Declaração que impõe a universalidade dos direitos humanos, sem
confinamentos e sobretudo sem máscaras.
* Presidente das Mulheres Socialistas/FAUL
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
17/04/20
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