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IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
01/010/19
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Amor e uma campanha
A minha primeira campanha eleitoral aconteceu no primeiro ano em que
houve eleições livres em Portugal, tudo por causa de uma paixão. Antes
disso, lá por casa, o entusiasmo não era assim muito, mas ninguém se
intrometia nas minhas escolhas, que na listas da escola variavam entre a
UDP e o CDS, conforme a paixão mandava, que isto de ser adolescente é
uma vida muito parecida com a dos marinheiros.
Mas aquela rapariga era tão bonita que se tornou irresistível ao
miúdo de 14 anos que eu era, e o “tens de vir para o partido” com que me
enganou, sobretudo porque acompanhado por um ofuscante brilho nos
olhos, na cara, no sorriso, no cabelo, comigo a pensar que era tudo por
mim. O seu brilho vinha do que a revolução anunciava e eu, perdido de
amores, inscrevi-me no partido.
Ocupámos uma casa de um capitalista qualquer para servir de sede do
partido e rapidamente me vi transformado em servente de pedreiro só para
o momento em que ela me trazia as sandes e a garrafa de Sumol,
acrescentando um beijo e um sorriso à ementa. Noutros dias andávamos de
braço dado em manifestações e campanhas, noutros ainda, pela calada da
noite, a colar cartazes e nessas noites podia roubar-lhe, por mais
tempo, beijos e algumas intimidades.
Rapidamente a sede do partido ficou pronta e rapidamente começaram os
primeiros problemas. Éramos de bairros diferentes e quando alguém o
percebeu recambiou-me para a sede correspondente à morada dos meus pais.
Comecei a perceber melhor onde me tinha enfiado, quando me vi com a
chave da sede do partido do meu bairro com a missão de ir buscar
propaganda para uma manifestação e dei de caras com um poster de
um homem cuja cara não me inspirou simpatia, antes pelo contrário.
Nessa noite vi-me enfiado, de poster, com a fronha do senhor, na mão,
dentro de um carro, obrigado a dar vivas a umas coisas e desejar morte a
outras. A rapariga seguiu noutro carro, ainda a vi de passagem, cheguei
atrasadíssimo ao jantar em casa e nessa noite percebi que amor,
manifestações e campanhas eleitorais não eram coisa que eu gostasse de
misturar.
A ideia de um amor e uma cabana rapidamente se tinha transformado num
amor e uma campanha, esfumando-se em definitivo quando as colagens de
cartazes nos dividiram por grupos diferentes. Desisti de abraçar a causa
politica porque o que eu queria mesmo era andar abraçado à rapariga.
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01/010/19
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