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IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
08/09/19
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Ambiente:
menos coqueluche,
mais realismo
Dando uma leitura atenta a todos os programas eleitorais, o ambiente
ocupa lugar de destaque nas propostas para os próximos quatro anos dos
partidos que se candidatam as estas eleições. É de estranhar? Não. É de
desconfiar? Sempre.
Vivemos um tempo estanho em que há coisas que
têm de atirar-se para dentro dos nossos olhos para as vermos, e foi mais
ou menos isso que aconteceu com o ambiente. Apesar de todos os avisos
dos entendidos, de todos os alertas dos ativistas, só há bem pouco tempo
começou o chamado establishment a dar pelo aquecimento global -
ainda assim com algum pé atrás, esgares de nojo e sentimentos de
dúvida. E não por acaso: todas as mudanças do clima atingem diretamente o
nosso modo de vida, sobretudo o ocidental e capitalista, como diz o PCP
no seu programa eleitoral. O que está em causa é o dia-a-dia que
levamos, e como o alimentamos com uma economia de abundância.
É também por isso que soa artificial a forma como o ambiente
arrebatou as intenções dos partidos. Porque, a querer mudar alguma
coisa, eles terão de mudar muito. Nomeadamente, no que aos mais
tradicionais diz respeito, essa certa forma de vida que está baseada num
modelo económico. Não há mudança ambiental sem alterações profundas na
economia como a vivemos. E no modelo básico que todos os partidos do
arco da governação defendem é difícil pensar um mundo que não aguenta
mais o crescimento constante - já se fala numa corrente científica do
"decrescimento", ou degrowth.
Não haverá melhor ambiente
sem mudarmos de vida. Quem passeia numa grande capital europeia não pode
deixar de reparar na insustentabilidade deste modelo de usa-deita fora,
de excesso de consumo, utilização desenfreada de energia, produção
contínua de lixo, ausência de qualquer contacto com a natureza. E não há
bicicletas, ou trotinetas, ou patins em linha que nos valham - o
problema está na ordem natural das coisas. Ou artificial, melhor
dizendo.
Ora, não há quem apresente um modelo alternativo, nos
programas eleitorais que lemos. Há, por exemplo, muita conversa sobre
energia e como temos de a substituir. Mas ninguém se refere ao facto de
que não podemos usar toda a energia de que precisamos neste momento. Nem
o PAN apresenta uma mundividência diferente, este partido que, aliás,
se agarrou com unhas e ganas à questão ambiental - sendo que nas suas
primeiras incursões políticas ligava mais aos animais do que à natureza,
algo que por vezes é incompatível. Tendo percebido o ar dos tempos,
aproveitou-o e ocupou o terreno.
Que é o que faz a política, e
assim deve ser, exceto no caso do ambiente, em que menos é mais. Como
diz o Daniel Deusdado na edição de hoje, não podemos pensar em ambiente,
de forma séria, e querer construir um aeroporto na Margem Sul, "manter o
faz-de-conta sobre as monoculturas de eucalipto e pinheiro" ou
construir mais não sei quantas barragens. São coisas incompatíveis e que
podem custar votos.
Ponto positivo: não há, em nenhum programa,
qualquer sintoma de negacionismo - o ambiente é uma unanimidade.
Resta-nos esperar que não seja burra.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
08/09/19
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