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* Advogada
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
16/05/19
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A proteção do
doente oncológico
no contexto laboral
Lamentavelmente, o doente oncológico ainda é estigmatizado e, frequentemente, vítima […] de 'mobbing' laboral - assédio moral sobre o trabalhador, que é a parte mais vulnerável da relação jurídica.
O direito laboral português tem um grande caminho a percorrer no que diz
respeito à tutela jurídica dos doentes oncológicos. Não se entenda que o
legislador tenha sido relapso, mas esta temática obriga a uma atuação
mais incisiva.
É preciso mostrar que
falta um verdadeiro regime jurídico próprio para os doentes oncológicos e
que, não obstante a incidência do cancro estar a aumentar na população
ativa, não é menos verdade que a taxa de sobrevivência tem cada vez
maior expressão. É inevitável que se façam determinadas perguntas: Como
proteger o doente oncológico no regresso ao trabalho? Qual a postura da
entidade empregadora? O que acontece à relação jurídico-laboral?
Aquela que é considerada a "doença do século" já agasta suficientemente
as pessoas. A agressão dos tratamentos e o desgaste psicológico não
deveriam cumular-se com um regime jurídico que não os protege "in
totum".
O Código do Trabalho é perentório ao proibir qualquer
prática discriminatória contra o trabalhador em razão de doença - sendo
no entanto necessário aplicar este regime por analogia quando nos
referimos ao trabalhador sobrevivente de cancro. Também a Lei n.º
46/2006 nos auxilia nesse sentido mas não é suficiente. Aliás, acredito
que a Liga Portuguesa Contra o Cancro também se deparou com o vazio de
legislação específica, e essa terá sido a razão para a elaboração de um
Guia dos Direitos Gerais do Doente Oncológico. Isto porque, na vigência
da relação laboral, deveria permitir-se que o trabalhador sobrevivente
de cancro pudesse regressar ao seu posto de trabalho sem qualquer
dificuldade.
Veja-se o seguinte exemplo: um doente oncológico
que, após os tratamentos, pretende retomar as suas funções na empresa,
munido de um Atestado Médico de Incapacidade Multiuso. Este trabalhador
pode depara-se com os seguintes cenários: 1) a entidade patronal
pretende retirá-lo do cargo que ocupava, alterando para categoria
profissional inferior; 2) a entidade patronal pretende, em sequência,
diminuir-lhe a retribuição. O que fazer?
A lei permite subsumir a
situação do doente oncológico aos regimes aplicáveis, quer ao
trabalhador com capacidade reduzida, quer ao trabalhador com deficiência
ou doença crónica. Por esta ordem de razões, o empregador tem o dever
de adaptar as condições de trabalho à capacidade do trabalhador, sem
qualquer reserva. Num sistema harmonioso, o trabalhador deverá ser
dispensado de prestação de trabalho em determinadas alturas e não ser
obrigado à prestação de trabalho suplementar. Relativamente à diminuição
da retribuição - e admitindo que não houve mudança para categoria
profissional inferior por ausência de concordância do trabalhador - que
se sentia perfeitamente capaz, tal não pode operar em obediência ao
princípio basilar da irredutibilidade salarial, sob pena de o empregador
incorrer numa contraordenação muito grave.
Lamentavelmente, o
doente oncológico ainda é estigmatizado e, frequentemente, vítima de um
"bullying" laboral ou, mais corretamente, de "mobbing" laboral - assédio
moral sobre o trabalhador, que é a parte mais vulnerável da relação
jurídica, e que acaba subjugado em qualquer tentativa negocial.
Não
tenho dúvidas de que, existindo tutelas diferenciadas para trabalhador
com capacidade de trabalho reduzida e para trabalhador com deficiência
ou doença crónica, deve legislar-se, de fundo, sobre esta matéria. Sem
estas alterações, continuaremos a aceitar a preterição dos direitos
fundamentais destes cidadãos.
* Advogada
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
16/05/19
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