.
IN "OBSERVADOR"
24/03/19
.
A caixa de Pandora
Não é preciso ser historiador, mas é necessário saber História,
para compreender que a humanidade está prestes a colidir de novo com um
icebergue. Os sinais não enganam.
As democracias mundiais, o projeto europeu e a paz mundial estão a
implodir a uma velocidade de cruzeiro. A metáfora dilacerante, outrora
criada por Eric Hobsbawm, alusiva à agonia da democracia alemã volta a
aplicar-se: «Estávamos no Titanic, e todos sabiam que estava para bater
no icebergue».
Todos sabiam e ninguém evitou a tragédia: a Alemanha foi
subjugada pelo nazismo; depois vieram a II Guerra Mundial, a Shoah, e as bombas atómicas despejadas sobre Hiroshima e Nagasaki.
Não
é preciso ser historiador, mas é necessário saber História, para
compreender que a humanidade está prestes a colidir de novo com um
icebergue. Os sinais não enganam. O efeito Trump. O brexit. O
internacionalismo populista. O ódio aos refugiados. A emergência dos
nacionalismos. O saudosismo dos fascismos. O colapso ecológico. A
cupidez dos apparatchiks de muitos partidos democráticos, que
perderam a consciência ética e social e já não identificam a política
como um serviço cívico. A própria palavra cidadania foi usurpada pela
novilíngua do capitalismo financeiro, banalizada e esvaziada do seu
significado.
As
massas populares vivem absortas nas redes sociais e bestializadas pela
«civilização do espetáculo». Estão alienadas, mergulhadas no reino do voyeurismo, do hedonismo e do niilismo. Habitam no universo das artes frívolas e efémeras, da literatura light, das rixas de «futebolês», dos desfiles dos estilistas e top-models, dos acepipes dos cheffs, da moral dos diretores executivos (CEO), das lições dos tudólogos, das alarvidades dos reality shows e da evasão dos blockbusters.
Urge
transpor esta encruzilhada, antes que seja demasiado tarde. Antes que
deixe de existir Pão no Circo. Antes que uma elite de hooligans
populistas imponha ao mundo uma distopia totalitária. Ou antes que «os
pobres não tenham mais nada para comer a não ser os ricos».
Importa
humanizar a humanidade, inocular ESPERANÇA na humanidade. Rumar contra a
maré e reinventar a democracia. Reanimar os serviços públicos: saúde,
educação, justiça, habitação. Educar sem falácias e burocracias.
Dispensar os políticos, «pedagogos de gabinete» e comissários políticos
que persistem em decretar o «eduquês» e trouxeram o caos às escolas.
Revalorizar a História, a Geografia, a Filosofia. Voltar a estudar a
história do pensamento político e filosófico. Em Auschwitz, pode ler-se a
frase lapidar de George Santayana: «Aqueles que não recordam o passado
estão condenados a repeti-lo». Revalorizar a Ciência, as Artes e as
Letras.
Importa
nunca contemporizar com líderes e partidos populistas e justicialistas.
Tolher os nacionalismos, porque os «nacionalismos são a guerra». Não
desistir do projeto europeu, pois, apesar de todos os seus defeitos, não
devemos ignorar que a Europa continua a ser o local do mundo onde
melhor se vive e nenhum país europeu consegue impor-se sozinho no mundo
global.
Professor de História do Agrupamento de Escolas de Oliveira do Hospital
IN "OBSERVADOR"
24/03/19
.
Sem comentários:
Enviar um comentário