.
* Porto Business School
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
23/01/19
.
Confiança em baixo,
populismo em alta
Uma empresa que opera numa sociedade caracterizada pela desconfiança terá de lidar com muita regulamentação e burocracia, quando quiser expandir-se. Em contraste, fazer negócios num país como a Escandinávia, onde há altos níveis de confiança nos negócios e na sociedade, é muito mais fácil.
Nos últimos anos, o Ocidente assistiu a um aumento inesperado do
populismo, culminando na votação do Reino Unido para a saída da União
Europeia, eleição de Donald Trump como Presidente dos EUA, em 2016 e
numa forte presença de Marine Le Pen, nas eleições presidenciais
francesas, em 2017.
A ascensão do
populismo na União Europeia (UE) é relevante. Enquanto projeto de
unificação supranacional, a UE tem sido bastante eficaz em preservar a
paz na Europa e em trazer os países da Europa Oriental para o modelo
democrático europeu. No entanto, a crise económica demonstrou um
conjunto de lacunas no desenho das instituições económicas e políticas
europeias. Muitos europeus parecem insatisfeitos com os políticos e as
instituições, locais e da UE.
A confiança pública nas
instituições pode, agora, ser bastante baixa, mas é um ingrediente
necessário para uma sociedade funcional. Elias Papaioannou, professor da
London Business School, levou a cabo uma pesquisa intrigante sobre o
que acontece quando a confiança falha - as pessoas que perdem a fé nas
instituições do seu país e começam a votar em qualquer um que lhes
prometa uma vida melhor. Papaioannou e os seus co-investigadores mostram
evidências de que o crescimento do populismo em toda a Europa tem menos
a ver com o sentimento anti-imigração e mais com o aumento do
desemprego e a queda da confiança.
Analisando a evolução
do desemprego, os níveis de confiança, geral e política, atitudes e
crenças em relação à imigração e a votação em mais de 200 regiões
europeias, de 26 países europeus, entre 2000 e 2017, Papaioannou e os
co-autores deste estudo descobriram uma correlação entre maior
desemprego e maior apoio populista e a partidos políticos antissistema.
Os mesmos autores encontraram também uma forte ligação entre o
desemprego regional e o declínio da confiança em relação às instituições
políticas europeias e nacionais.
Por que nos devemos
[escolas de negócios] preocupar com todas estas questões? Reconstruir a
confiança é uma boa proposta de negócios. Os líderes empresariais
precisam perceber a importância da confiança nos seus clientes e nos
cidadãos da sociedade em que operam. Não se trata de um sentimento
confortável. Trata-se, sim, de evitar uma alternativa sombria. Uma
empresa que opera numa sociedade caracterizada pela desconfiança terá de
lidar com muita regulamentação e burocracia, quando quiser expandir-se.
Em contraste, fazer negócios num país como a Escandinávia, onde há
altos níveis de confiança nos negócios e na sociedade, é muito mais
fácil. O público espera alta qualidade e altos padrões éticos. As
empresas cumprem as regras. Isso reforça a confiança geral e
empresarial, que por sua vez promove valores cívicos e melhora a
administração.
Já em 1972, o economista e prémio Nobel,
Kenneth Arrow, postulou: "Praticamente todas as transações comerciais
têm, em si, um elemento de confiança. Pode argumentar-se, de maneira
plausível, que grande parte do atraso económico no mundo pode ser
explicado pela falta de confiança mútua". E esta não foi, certamente,
uma ideia nova: o filósofo grego Platão, escrevendo por volta de 380 aC,
afirmou que "o que precisamos para uma boa sociedade são pessoas que
confiam umas nas outras e exibem altos níveis de virtude cívica", algo
com que os grandes pensadores do Iluminismo Europeu concordaram, também.
Infelizmente,
hoje, a confiança nas principais instituições democráticas das
economias capitalistas modernas pode ter sido prejudicada
permanentemente, mesmo após a recuperação económica, sobretudo entre as
gerações mais jovens, que se voltaram cada vez mais para os partidos
populistas.
Há lições importantes e implicações políticas.
A primeira é a importância de reduzir o desemprego para restaurar a
confiança na democracia e a confiança nas instituições. Para combater o
desemprego, os governos precisam implementar políticas de promoção do
crescimento. Na maioria dos países, no entanto, as altas taxas de
desemprego estão concentradas entre os trabalhadores não qualificados,
que sofreram mais com mudanças tecnológicas, terceirização e competição
global. A formação pode ajudar a resolver este problema e, como tal, os
países da UE devem melhorar a qualidade dos seus sistemas de educação
profissional e de aprendizagem ao longo da vida.
Mas
também é vital preservar a confiança e as atitudes de mente aberta dos
cidadãos que enfrentam crescente insegurança económica. Os países
europeus poderiam preservar a confiança de seus cidadãos com melhor
segurança social e redes de segurança para os trabalhadores que estão
atualmente desempregados ou enfrentam dificuldades económicas.
Manter
a confiança geral e política é condição sine qua non para as muito
necessárias reformas. O movimento anti-governo dos "coletes amarelos",
em França exemplifica a falta de tal confiança política. A perda de
confiança nas instituições políticas pode, em última análise, explicar a
contínua estagnação económica na Europa e o aumento do populismo.
* Porto Business School
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
23/01/19
.
Sem comentários:
Enviar um comentário