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IN "EXPRESSO"
21/12/18
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A procrastinação natalícia
A quantidade de gente que anda às compras de Natal faz-nos questionar
se o processo de comprar uns presentes para familiares e amigos é assim
tão difícil e aborrecido que o adiamos dia após dia, até ao ponto em
que adiar mais se torna impossível.
O ato constante de adiar o
que se planeia fazer não é necessariamente preguiça, mas chama-se antes
procrastinação. Há vários motivos pelos quais se procrastina. Em geral,
quando a tarefa não é aliciante ou nos foi imposta existe a tendência a
substitui-la por outras atividades mais prazerosas.
Também, quando o
retorno da execução de uma tarefa não é imediato, como por exemplo
trabalhar num projeto longo, é fácil desviar a atenção e o esforço para
atividades de concretização mais imediata que dão a sensação agradável
de “missão cumprida”. Mais, procrastina-se quando se tem receio de
falhar ou quando se é muito perfeccionista e se quer garantir que não há
um mínimo erro. O excesso de confiança e otimismo conduz também à
procrastinação, porque se sobrestima a capacidade e habilidade de
resolver uma tarefa num determinado espaço de tempo. Por último, há
ainda aqueles que consideram que a adrenalina de trabalhar sobre
pressão, com prazos curtos, os torna mais produtivos e criativos,
arrastando, assim, o começar da tarefa.
Não é difícil perceber
que as compras natalícias têm os ingredientes essenciais para serem
sistematicamente deixadas para amanhã. Primeiro, andar às compras para
aquele familiar que só aparece na consoada ou para o colega de trabalho
com o qual não se tem qualquer afinidade é aborrecido e não mais que uma
obrigação que a época e a sociedade impõem.
Segundo, fazer
compras atempadamente, por exemplo em novembro, como alguns
“especialistas” aconselham, implica que o retorno da atividade não seja
tão imediato. Ou seja, o prazer que se retira por fazer alguém feliz com
a nossa prenda só se realizará passadas várias semanas, o que faz com
que se adie as compras e se escolha outra atividade que proporcione uma
satisfação mais imediata, como por exemplo, ir ao cinema. Mais, por
muito que se retire alguma satisfação e bem-estar por se pensar
antecipadamente na felicidade que a prenda pode causar em quem a recebe,
esta utilidade antecipada, como os economistas (comportamentais) a
apelidam, é menor quanto mais longínquo está o resultado final, ou seja
quanto mais longe do Natal se está. Ainda sobre a utilidade antecipada,
existe também o efeito negativo de se projetar o quão desagradável é
andar em lojas cheias de gente. Este “sofrer por antecipação” contribui
para que se deixe para outra altura as compras natalícias, mesmo tendo
consciência que noutra altura será ainda pior.
Ser perfeccionista
e procurar o presente ideal para cada amigo e familiar não ajuda muito a
evitar a procrastinação. Aliás, é uma tarefa quase impossível que pode
mesmo ser paralisante. Dar voltas e voltas num centro comercial, entrar
em lojas após lojas e sair de mãos vazias é um sinal que se está a
pensar demais. O problema é que quando isto acontece existe frustração e
a forma de a evitar é evitar andar às compras. Esta estratégia de
negação funciona até ao ponto em que não há mais tempo para adiar. No
limite os presentes são comprados à pressa e longe de serem os ideais.
Por
último, ser demasiadamente otimista e achar que não se precisa de muito
tempo para comprar presentes, ou que ir no dia 24 de manhã às compras é
ótimo porque não se encontra ninguém, acaba por dar maus resultados. E
como existem uns bons milhares a pensar desta forma, as lojas continuam
cheias até ao último minuto.
A procrastinação natalícia é “um
vírus” muito comum, mas há também aqueles que deixam as compras para a
última semana por motivos mais racionais. Por exemplo, pode acontecer
que se antecipem saldos nesta semana ou que se pretenda retirar vantagem
da entrega gratuita que é oferecida nesta altura em compras online.
Aliás, as compras online são uma boa estratégia para quem procrastina.
Nos Estados Unidos, a Amazon, por exemplo, retira proveito dos
enviesamentos comportamentais nesta altura natalícia, incentivando até a
procrastinação, através de entregas gratuitas em poucas horas.
Como
nota final fica o facto de que os homens procrastinam ligeiramente mais
do que as mulheres no que respeita às compras natalícias. Um inquérito,
em 2016, da National Retail Federation, a cerca de 6900 adultos
norte-americanos, mostrou que no início de dezembro, 17% dos homens e
13% das mulheres não tinham ainda feito qualquer compra de Natal. Na
terceira semana de dezembro, cerca de 42% dos homens e 48% das mulheres
disse já ter feito metade das compras. Estas diferenças têm sido
reportadas em inquéritos anteriores e são explicadas pelo o facto dos
homens terem, em geral, excesso de confiança, mas também comprarem menos
presentes.
Se realmente insiste em celebrar o Natal com a troca
tradicional de presentes, não deixe para amanhã o que pode faz hoje. E
fazer as compras hoje, por muito mau que seja, é melhor do que fazê-las
amanhã.
IN "EXPRESSO"
21/12/18
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