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IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
9/08/18
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Deixe como encontrou, por favor
A sustentabilidade do modelo económico deve ser enquadrada, no mínimo, com seguinte objetivo: deixar o planeta como se encontrou.
Nos últimos anos, observam-se fenómenos climáticos extremos,
conduzindo a cenários de catástrofe como incêndios descontrolados, secas
prolongadas, chuvas torrenciais, terramotos, maremotos,… É
inquestionável que no passado quaisquer destes acontecimentos extremos
também ocorreram; não constituindo absoluta novidade aquilo a que se
assiste na atualidade. Encontram-se relatos de fomes, pestilências,
variações extraordinárias de condições climáticas, ou extinções maciças
de espécies. Contudo, a ação humana em relação a estes acontecimentos é,
presentemente, maior que no passado e as suas consequências imediatas
estão igualmente mitigadas no curto prazo.
Se
o modelo económico atual caracterizado por elevado ritmo de consumo,
produção global massificada, e crescente afastamento de ciclos naturais é
diretamente responsável pela elevação do nível de vida de muitas
populações, contribuindo fortemente para a redução de enormes bolsas de
pobreza em múltiplos países, é igualmente devedora de um padrão de forte
rotatividade do consumo. O ciclo de vida de um produto manufaturado
encurtou - todos os quatro anos se espera que o automóvel seja
substituído, todos os dois ou três anos se antecipa a compra de um novo
telemóvel, ou o ciclo da moda deixou de se cingir a duas estações para
ser um contínuo de avanços de coleção. A alimentação libertou-se do
ciclo da natureza, contando poder-se comer, por exemplo, morangos todo o
ano. O peixe ou a carne colocados nas prateleiras dos supermercados
resultam de processos de industrialização com a proliferação de unidades
industriais de produção de suínos, aves de capoeira, ou douradas e
robalos. A concentração das populações em grandes cidades favorece
igualmente o corte da ligação ao ciclo da natureza.
As
sucessivas ondas de revolução industrial e a recente globalização estão
a exercer uma forte pressão sobre os recursos do planeta e a sua
capacidade de renovação. Certamente, no futuro, este padrão de produção e
consumo poderá ser suportado sem colocar em causa o equilíbrio do
planeta. Nesse sentido, um reencontro com a natureza e o seu ciclo podem
ser importantes. De igual modo, o modelo de transportes, em vez de ser
dominado por questões de automóveis elétricos ou automáticos, deverá
passar por uma lógica de partilha de transporte ou uma nova versão de
transportes públicos. O princípio de reutilização, reciclagem ou
recuperação de materiais, peças, utensílios, deverá dominar as
preocupações na produção e consumo. A procura pela satisfação
hiperbólica das necessidades individuais favorecerá o desenho e entrega
únicos, reduzindo a necessidade de embalagem, mas colocando desafios à
distribuição e logística.
Neste momento, a pegada da
humanidade afigura-se uma impressão demasiado forte. Donde, enquanto não
se evoluir para um modelo económico mais sustentável, importa engendrar
uma transição suportável. Na medida em que cada geração faz uma
ocupação temporária do planeta, deve-se encarar esse estabelecimento
como arrendamento de um espaço. Assegurando que não existe um retrocesso
no processo de redução global da pobreza e mantendo avanços regulares
de produtividade, importa garantir que a qualidade de vida intertemporal
(outra forma de dizer será: a saúde do planeta) não é posta em risco. A
sustentabilidade do modelo económico deve ser enquadrada, no mínimo,
com seguinte objetivo: deixar o planeta como se encontrou numa
perspetiva de sustentabilidade intertemporal de condições de vida. Ou
seja, se não se conseguir melhorar, pelo menos, evitar estragar.
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
9/08/18
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