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IN "EXPRESSO"
26/06/18
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Isso já não é
só culpa de Trump
Mais um tweet de Trump e
a questão da imigração passou a um novo patamar, depois do episódio das
crianças separadas dos pais e fechadas em grades. No domingo, o
Presidente norte-americano sugeriu que os imigrantes possam ser
deportados administrativamente, sem recurso a tribunais. A fronteira
passaria a ser um território em que a única lei é a ordem arbitrária.
Não é muito diferente do que hoje existe, mas o enunciado omnipotente é
clarificador.
No mesmo dia em que Trump tweetava a
sua nova conceção, reunia-se em Bruxelas uma cimeira “informal”, a que
faltaram diversos governos, incluindo Portugal, para discutir o assunto
migrações e para aplanar caminho para a cimeira formal do final desta
semana – a tal cimeira que ia resolver os problemas tão adiados da
reforma do euro e outras grandes questões. No domingo foi o que se
esperava, não houve texto final (um projeto chegou a ser escrito e foi
abandonado por exigência da Itália) e Merkel explicou, também num tweet à
saída da reunião, que “saímos daqui muito satisfeitos, imprimimos uma
nova direção no debate em curso”. Acrescentou, com alguma malícia, que a
cimeira revelou que há “boa vontade para discutir os desacordos”, mas
que o mais provável é não haver entendimento para uma política europeia
comum, antes acordos bilaterais e trilaterais, que ninguém sabe o que
serão e como serão.
O tempo, entretanto, aperta.
Merkel tem uma semana para apresentar ao seu governo uma solução
europeia, ou a CSU bávara poderá quebrar a aliança histórica da
democracia-cristã alemã e teremos eleições, caso a chanceler não ceda no
bloqueio à entrada de migrantes que tenham obtido entrada por outros
países. Seria uma rutura da regra de Dublin e o governo alemão parece
admitir esta possibilidade, que agravaria a tensão com os países da
fronteira do Mediterrâneo.
Ora, essa regra já tem um problema, de que a Itália, a
Grécia e a Espanha se queixam com razão: é que a maior responsabilidade
no acolhimento dos migrantes cabe aos países de fronteira e não houve
uma redistribuição suficiente desse esforço. Se a Alemanha, por pressão
da sua extrema-direita, tentar erguer uma barreira contra a mobilidade
dos migrantes, então torna-se impossível encontrar algum consenso.
Sabendo
disso, diversos governos europeus viram-se para outra solução, que
Conte apoiou em Bruxelas e que a Comissão já tinha sugerido: a criação
de “plataformas de desembarque” ou “centros de acolhimento”, que
bloqueariam os migrantes nos países do norte de África. Uma solução do
tipo do contrato com Erdogan, agora estendido a outros países. Mas, além
da constatação do fracasso desta solução vergonhosa com a Turquia, a
extensão do modelo é inviável, pois os governos africanos têm recusado a
alternativa, que lhes colocaria nas mãos a pressão social dos
refugiados e das pessoas desesperadas que tentam atravessar o
Mediterrâneo.
Pode-se então dizer que Trump
pressiona e incentiva a extrema-direita europeia e é visto como um
modelo por muita gente que não o confessa. Mas a crise migratória na
Europa é um problema agravado pelos governos europeus, que durante algum
tempo quiseram exibir a imagem humanitária mas que rapidamente
mergulharam em calculismo xenófobo. E isso já não é culpa de Trump.
IN "EXPRESSO"
26/06/18
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