05/08/2017

SEBASTIÃO BUGALHO

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São todos corruptos!

É evidentemente mais grave quem governa aceitar convites de uma empresa em litígio com o Estado que um deputado pagar (antes ou depois) uma viagem em que esteve com empresários. Como é que se pagam bilhetes que são convites (a custo zero e não transacionáveis) é já outro mistério...

Vinte e dois tipos atrás de uma bola durante noventa minutos chegariam para o corromper? A si, meu caro leitor, sim. Um joguinho de futebol. Depois de ter abdicado da sua carreira profissional para ir ganhar metade do salário para o Estado e perder toda a privacidade, um jogo de futebol influenciaria as suas decisões contra o interesse nacional? Não? Não gosta assim tanto de futebol? Ou não é assim tão corruptível? E de viagens, o que acha?

Fernando Rocha Andrade era um dos secretários de Estados mais competentes do atual governo; não só tecnicamente como em categoria política. Tanto a oposição quanto os bolsos dos contribuintes o sentiram: a eficácia era tremenda. A sua audição em Bruxelas sobre paraísos fiscais foi um exímio exemplo de como dizer tudo o que tinha para dizer sem dizer aquilo que não se podia ouvir.

Hugo Soares, apesar de uma primeira semana algo tosca, não pode ter chegado a líder de bancada mais jovem do PSD nos últimos dez anos sem o mínimo de capacidades – eu, pelo menos, espero que não.

Nem um nem outro estão distantes da investigação que decorre no Ministério Público, ainda que com responsabilidades divergentes.

É evidentemente mais grave alguém que governa aceitar convites de uma empresa em litígio com o Estado que um deputado pagar (antes ou depois) uma viagem em que esteve com empresários. Como é que se pagam bilhetes que são convites (a custo zero e não transacionáveis) é para mim outro mistério, que ficará certamente para o MP.

A questão, algo irónica, e que tem escapado ao debate nos casos das viagens de políticos é também outra.

Se um deputado for avençado de uma empresa – e eu não estou a dizer que algum deles é – poderia ter ido aos jogos do ‘Euro à ‘vontadinha, sem processos, sem levantamentos de imunidade. Dito de outro modo: segundo a lei, se a empresa x me levar ao jogo y e eu receber uma avença mensal dessa empresa, não há qualquer tipo de crime. É trabalho, é um cliente e é legal.

Dois dos deputados envolvidos, pelo contrário, estão em regime de exclusividade na Assembleia da República, prescrevendo de qualquer rendimento além do parlamentar, o que significa que não mantêm relações profissionais com nenhuma empresa. A moral da história, nesse sentido, é que a dedicação em exclusivo não compensa.

Alguém, por exemplo, pensa que o primeiro-ministro, quando se senta no camarote do estádio da Luz, influenciará de algum modo a legislação deste governo em benefício do Benfica? A mim, não me passa pela cabeça. E não se trata exatamente de um deputado anónimo.

Sugiro, por isso, aos carrascos da praça pública que façam o seguinte: respeitem a comunicação social, mas esperem pela justiça; mantenham a exigência, mas não generalizem.

É que no dia em que eles “forem todos corruptos”, qualquer um de nós poderá também sê-lo. Incluindo o meu caro leitor, que eu sei, porque o conheço bem e há algum tempo, nunca faria tal coisa.

IN "SOL"
01/08/17

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