23/01/2017

FILIPE BAPTISTA

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E se Trump 
desligar a internet?

Crescemos a ouvir que o Estado assenta em três poderes fundamentais e separados. E, de facto, eles existem e são constitucionalmente reconhecidos em quase todos os Estados mundiais.

No final do século passado, os media começaram a receber esse estatuto. A investigação jornalística, isenta e bem paga, permitiu erguer um novo pilar de poder na base do Estado, ou da sociedade, se quiserem. Aos poucos, a internet e os seus utilizadores livres têm assumido um papel de coliderança na formulação de opiniões e na denúncia de crimes. Grupos como os Anonymous ou a WikiLeaks têm assegurado esse desiderato.

Amanhã toma posse um homem que despreza os valores mais fundamentais da sociedade, que é indiferente ao establishment no seu país e ao equilíbrio de poderes mundiais.

Trump não teme os media porque os despreza e porque, de certa forma, acha que os pode controlar. Trump aparenta não temer nada exceto uma coisa: a internet, ou melhor, os utilizadores livres da internet e que a dominam. O grupo Anonymous já declarou guerra a Trump, afirmando que este se vai arrepender nos próximos anos. Poderá Trump contornar esta ameaça?

A internet tem sido um pilar fundamental da política dos Estados Unidos desde a sua criação, na década de 90. Trump tem vindo a deixar pistas deste seu temor e uma vontade inequívoca de o combater: “We’re losing a lot of people because of the internet (…) We have to talk... about, maybe in certain areas, closing that internet up in some way.” O que propõe é a filtragem da internet, de forma aberta e descarada. Os seus antecessores também o fizeram? Sim, mas só graças a Snowden o sabemos agora.

Pode Trump desligar a internet? Criar uma grande firewall? Pode! E pode não precisa do Congresso para o fazer.

A secção 606 da Lei de Comunicações de 1934, dos Estados Unidos, prevê a possibilidade de aplicação de medidas de emergência que permitam o controlo das instalações de comunicações. Basta que o presidente declare que há uma ameaça de guerra ou “um estado de perigo público”. Esta possibilidade foi confirmada, em 2010, num relatório do Senado que concluía que a secção 606 “dá ao presidente a autoridade para assumir as comunicações nos Estados Unidos e, desta forma, fechar redes de telecomunicações”.

Não é de agora. Já Joseph Lieberman (senador independente) tentou criar um “internet kill switch” em 2010. Também o FCC (regulador das comunicações) tentou usar a sua autoridade para impor a neutralidade de Rede, que basicamente permite discriminar tráfego, entretanto negada pelos tribunais.

É mais uma frente que Trump abre e talvez a mais perigosa. Demonstra o desprezo que tem pela sociedade e pela liberdade de expressão. E remata com “Somebody will say, ‘Oh, freedom of speech, freedom of speech.’ These are foolish people”.

A internet é uma ferramenta fundamental de desenvolvimento humano. Espero que as “foolish people” deste mundo mostrem a Trump que há limites para tanta insolência!

IN "i"
19/01/17

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