17/12/2016

MARIA HELENA MAGALHÃES

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Posta em sossego à força!

A coleção que uma longa batalha judicial conseguiu subtrair à fúria mercantilista do anterior governo.

Aí está ela, posta em sossego e à vista de quem quiser visitá-la, na Casa de Serralves – desde o passado dia 1 de outubro e até 28 de janeiro p.f. –, a coleção Joan Miró, pertença do Estado português após a nacionalização do Banco Português de Negócios (BPN) em 2008. Está no Porto e no Porto ficará definitivamente – depois das necessárias obras de adaptação em Serralves. A coleção que uma longa batalha judicial conseguiu subtrair à fúria mercantilista do anterior governo, apostado no ver-quem-dá-mais – ou nem isso... – de tudo quanto lhe parecesse capaz de render dinheiro. Em nome do superior interesse pátrio, do respeito escrupuloso dos ditames da troika, a bem-aventurada que nos iria resgatar da bancarrota e condenar à pobreza controlada para não mais vivermos acima das nossas possibilidades, Portugal devia despojar-se de toda a riqueza que pudesse ser transformada em bens transacionáveis, a bem dos mercados e... da tal “saída limpa”, e que limpa! Viu-se!

Não passar a patacos a coleção Miró esteve longe de ser uma decisão consensual, pois o dinheiro resultante das obras mercadejadas havia de servir para tapar algum buraco nas contas públicas, e as obras de arte, além do mais, não servem para encher a barriga a ninguém e em Portugal há quem
não tenha o suficiente para comer. E muitos a quem a maldita crise que nos tolheu lançou no desespero. Pois! Bem haja quem se atravessou no caminho dos bufarinheiros da pátria!

Se a arte não enche barriga, o que é discutível, o medo matará a fome? Também não é previsível, todavia acontece. Os últimos relatos vindos de Alepo, a cidade mártir que o regime sírio quer retomar sem olhar a meios nem a vidas, dão conta da inimaginável condição dos milhares de civis encurralados nos escombros da guerra que desesperadamente procuram refúgio, sem saber como nem onde. A anunciada trégua que os inefáveis amigos russos de Assad deram por garantida aumentou o banho de sangue, já que os combates prosseguiram, porventura mais ferozes. É incalculável o número de vítimas, mas sabe-se que muitas, mesmo muitas, são crianças! Os depoimentos dos refugiados que nos chegam – e nem é bom falar dos refugiados que já chegaram à democrática, cristã e solidária Europa... – são de estarrecer: não há medicamentos, não há água, não há eletricidade, não há alimentos, nada! E... “o medo tira-nos a fome”! Vergonha!

É este o mundo que aguarda o novo secretário-geral das Nações Unidas (ONU). António Guterres prestou juramento, na passada segunda- -feira, na Assembleia-Geral da ONU, cujo presidente, Peter Thomson, afirmou estarmos perante “um líder para este tempo quando temos de transformar o mundo para ser um melhor lugar para todos”. Palavras de circunstância, elogios a rodos, mesmo para o desenxabido Ban Ki-moon, felizmente de saída. Guterres toma posse no próximo dia 1 de janeiro.

Oxalá o deixem pôr-se em sossego, mesmo que seja à força! O mundo não vai mudar porque vai entrar em cena um novo senhor da ONU. O mundo pode mudar se alguém conseguir mudar a ONU. E isso não é tarefa de um homem só.

* Gestora

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14/12/16

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