25/08/2016

DULCE NETO

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9 perguntas 
(e mais umas quantas) 
a Passos Coelho

1. Há um ano, galvanizava a plateia. Sim, era primeiro-ministro à porta de eleições, com indicadores económicos a dar sinais positivos. Vestia um blazer escuro, uma camisa branca a deixar ver a pele bronzeada. No domingo, sem casaco, de camisa azul entreaberta, com os efeitos do sol igualmente visíveis, era, no entanto, notória, quase confrangedora, a falta de entusiasmo provocada pelas suas palavras. Claro que o valor de um discurso não se mede pelos aplausos. Mas, Pedro Passos Coelho, foi por isso, por sentir que não estava a mobilizar as hostes, que se viu obrigado a gritar "Viva Portugal"? Para que as palmas enchessem o passeio do calçadão da Quarteira na grande festa do PSD?

2. Sabia que o seu discurso gerava muita expectativa. A festa do Pontal assinala a rentrée política, todos queriam saber o que o líder do maior partido da oposição tinha para comunicar ao País e animar os militantes. Queriam ver se deixou de esperar sentado o futuro e se em vez disso o antecipa com novas ideias. Que projectos guarda para os grandes problemas. Que estratégia para levar o partido ao poder que perdeu no pós-eleições. Mas as suas palavras, pouco estruturadas, resultam vazias. Porque é que insiste em trazer apenas e outra vez a leitura "realista", como disse, das coisas?

3. Os números até lhe eram favoráveis. Os indicadores do INE mostraram, dois dias antes, que a economia não está a crescer, que a aposta da "troika de esquerda" no consumo interno não está a resultar. Com este trunfo na mão, porque é que praticamente só diz que o "Governo está esgotado" sem avançar alternativas, sem revelar o que pensa para Portugal?

4. Se calhar ainda não ouviu o seu antigo amigo e conselheiro, Ângelo Correia, frisar que "um partido se impõe pelas políticas quando está no poder e pelas ideias quando está na oposição". Já conhecemos as suas políticas, não sabemos as suas ideias para o que se segue. Saiu há menos de um ano do governo. Como pensa racionalizar a função pública? Fazer a reforma do Estado? Resolver o problema do sistema financeiro? Privatizaria a Caixa Geral de Depósitos, por exemplo?

5. Há vozes dentro do partido a pedir que mude de táctica. Que deixe de querer ganhar à custa da derrota da esquerda. Que não sonhe voltar a ser líder devido ao desastre económico -financeiro. Que faça surgir sangue novo. Que traga esperança. Que abandone o mantra do "isto-vai-correr -mal". Porque é que não os ouve? Porque é que decide tudo sozinho?

6. Ah, é verdade que desta vez não demonizou a aprovação do Orçamento do Estado para 2017. Até disse que a esquerda o vai aprovar. Referiu-o para depois, se algo correr mal, os responsabilizar em conjunto?

7. Tem razão na grande questão: a economia não está a arrancar. E o que que tem o presidente do PSD para oferecer? Que vai apresentar uma reflexão sobre políticas sociais? É tudo? Não sabe o que quer para o País? Ou sabe e porque o sabe – mais austeridade – não o diz porque ninguém quer ouvir isso?

8. Até às autárquicas o seu lugar no PSD não estará em causa. Quem dominar as bases nesse processo controlará o partido. Está a prepará-las? Não com este discurso do Pontal, seguramente. E Lisboa (à espera de Santana Lopes) e Porto (sem nome para competir com Rui Moreira) parecem problemas sem solução fácil.

9. As sondagens, que só pode analisar com atenção, não lhe sorriem. Porque é que insiste na trajectória do abismo? Porque ser inflexível, custe o que custar, é a sua imagem de marca? O seu capital político? Porque não consegue sair do labirinto que criou? O maior fã de uma política económica restritiva não pode defender outra coisa? Conseguiu tirar o blazer de primeiro-ministro mas a pele não se despe? E que tal ler sobre Nuno Álvares Pereira, o estratega da Batalha de Aljubarrota? Sabia que no domingo se assinalaram 631 anos da reconquista do poder?

* Subdirectora

IN "SÁBADO"
18/08/16
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