Apologia do corpo
no envelhecimento
Na minha opinião, a luta desenfreada deve ser contra a deserotização do corpo a envelhecer e não contra o processo natural e vital que é o envelhecimento.
O
Verão apenas começou e estou cansada de tantas advertências e pressões
para conseguir um corpo magro, tonificado, e jovem. São receitas de
refeições light, prescrições de chás e alimentos com funções detox,
adelgaçante ou diurética, anúncios de cremes e óleos, tratamentos que
engolem adipócitos, procedimentos que fazem desaparecer celulite,
modalidades de exercícios físicos para todas as agendas, dos trinta
minutos diários aos cinco para os mais ocupados. Tudo a favor de um
determinado modelo de beleza que é ditado socialmente. E nesse modelo
dominante o padrão de beleza está associado à idade jovem, ao vigor e à
forma física. É um modelo extraordinariamente exigente sobretudo para a
mulher, mas também já para o homem. É um modelo que exclui, despreza e
expulsa totalmente um corpo a envelhecer.
Passados quarenta anos de enormes transformações na sociedade, continua a ser verdade a afirmação de Susan Sontag:
“Um homem, inclusive um homem feio, mantém-se sexualmente elegível até ter uma idade avançada. É um parceiro aceitável para uma mulher jovem e atraente. As mulheres, tornam-se inelegíveis numa idade muito mais jovem. Assim, para a maior parte das mulheres, o envelhecimento constitui um humilhante processo de desqualificação sexual” (Susan Sontag, 1975)
Querem-se corpos magros e jovens, e não praticar exercício físico é quase um sinal de debilidade de personalidade. Proliferam as campanhas “anti-aging” (odeio o nome), em que os cremes lifting para senhoras a partir dos 50 anos são publicitados por mulheres de 30. Na minha opinião, a luta desenfreada não deve ser contra o processo natural e vital que é o envelhecimento, mas sim contra a deserotização do corpo a envelhecer. Aqui, declaro a minha defesa do erotismo no envelhecimento e da possibilidade livre da atracção entre pessoas que procuram o prazer independentemente da idade. Aqui me declaro contra as brigadas anti-aging que negam o envelhecimento e prometem juventudes eternas (que grande chatice…!).
Estou contra a tirania e escravatura do corpo tonificado e jovem. Uma ditadura que é transversal a todas as idades, que não afecta só as mulheres na segunda metade da vida. E a anorexia nas miúdas de 17 anos? E os rapazes de 16 a fazerem depilação definitiva? E a elevadíssima frequência de cirurgia estética mamária em miúdas no final da adolescência, em países como a Itália? Afirmo-me contra as imposições sociais sobre padrões de beleza e de atracção que desconsideram e anulam a diversidade. E ainda mais contra aquela coisa abominável que é a subjugação ao que os outros pensam, ao que os outros vão dizer. Isto sim, uma falta de liberdade que nos impede de crescer.
Sou a favor do exercício físico, sim, ao longo de toda a vida. Dedicar tempo e trabalho ao cuidado do corpo e a favor da saúde e do bem-estar, sempre. Também sou a favor da cirurgia estética e outros procedimentos que visam ajudar a pessoa a sentir-se mais atraente, sim, mas sem cairmos nas redes da tirania. Que seja sempre uma escolha livre, que vem de dentro, e não em resultado de malditas pressões externas para cumprir requisitos e exigências impostas socialmente que tantas vezes acarretam culpas e frustrações. Os problemas de auto-imagem são altamente perturbadores da vivência sexual, sobretudo nas mulheres. Não gostar do próprio corpo, ter uma imagem negativa dele, não se sentir atraente, é um dos factores que mais afecta o desejo sexual, a excitação, e a satisfação sexual. Digamos que a dificuldade com a auto-imagem é um veneno para o prazer sexual.
Não ouço falar sobre a aceitação do processo de envelhecimento. De como pode ser importante ficar cara a cara com as rugas, com a perda da elasticidade da pele, dos músculos, dos tendões, entre outras coisas que se perdem. O que aqui defendo é a aceitação do envelhecimento com respectivos danos e perdas, numa atitude positiva que encara este período da vida como mais um momento desenvolvimental como todos os anteriores, em que se pode explorar as mais-valias e desfrutar e tirar partido dessa sabedoria que vem da experiência da vida longa. E sim, encontrar estratégias para minimizar as perdas e praticar actividade física adequada, que traga gozo e prazer. E que seja uma escolha livre e no sentido da saúde e do bem-estar. Não por obrigação ou por sucumbir às malditas pressões sociais e ao inferno dos outros, do que eles dizem e do que eles pensam. E isto quanto mais cedo melhor! Não pensem que é tarefa dos velhos e comecem já.
Passados quarenta anos de enormes transformações na sociedade, continua a ser verdade a afirmação de Susan Sontag:
“Um homem, inclusive um homem feio, mantém-se sexualmente elegível até ter uma idade avançada. É um parceiro aceitável para uma mulher jovem e atraente. As mulheres, tornam-se inelegíveis numa idade muito mais jovem. Assim, para a maior parte das mulheres, o envelhecimento constitui um humilhante processo de desqualificação sexual” (Susan Sontag, 1975)
Querem-se corpos magros e jovens, e não praticar exercício físico é quase um sinal de debilidade de personalidade. Proliferam as campanhas “anti-aging” (odeio o nome), em que os cremes lifting para senhoras a partir dos 50 anos são publicitados por mulheres de 30. Na minha opinião, a luta desenfreada não deve ser contra o processo natural e vital que é o envelhecimento, mas sim contra a deserotização do corpo a envelhecer. Aqui, declaro a minha defesa do erotismo no envelhecimento e da possibilidade livre da atracção entre pessoas que procuram o prazer independentemente da idade. Aqui me declaro contra as brigadas anti-aging que negam o envelhecimento e prometem juventudes eternas (que grande chatice…!).
Estou contra a tirania e escravatura do corpo tonificado e jovem. Uma ditadura que é transversal a todas as idades, que não afecta só as mulheres na segunda metade da vida. E a anorexia nas miúdas de 17 anos? E os rapazes de 16 a fazerem depilação definitiva? E a elevadíssima frequência de cirurgia estética mamária em miúdas no final da adolescência, em países como a Itália? Afirmo-me contra as imposições sociais sobre padrões de beleza e de atracção que desconsideram e anulam a diversidade. E ainda mais contra aquela coisa abominável que é a subjugação ao que os outros pensam, ao que os outros vão dizer. Isto sim, uma falta de liberdade que nos impede de crescer.
Sou a favor do exercício físico, sim, ao longo de toda a vida. Dedicar tempo e trabalho ao cuidado do corpo e a favor da saúde e do bem-estar, sempre. Também sou a favor da cirurgia estética e outros procedimentos que visam ajudar a pessoa a sentir-se mais atraente, sim, mas sem cairmos nas redes da tirania. Que seja sempre uma escolha livre, que vem de dentro, e não em resultado de malditas pressões externas para cumprir requisitos e exigências impostas socialmente que tantas vezes acarretam culpas e frustrações. Os problemas de auto-imagem são altamente perturbadores da vivência sexual, sobretudo nas mulheres. Não gostar do próprio corpo, ter uma imagem negativa dele, não se sentir atraente, é um dos factores que mais afecta o desejo sexual, a excitação, e a satisfação sexual. Digamos que a dificuldade com a auto-imagem é um veneno para o prazer sexual.
Não ouço falar sobre a aceitação do processo de envelhecimento. De como pode ser importante ficar cara a cara com as rugas, com a perda da elasticidade da pele, dos músculos, dos tendões, entre outras coisas que se perdem. O que aqui defendo é a aceitação do envelhecimento com respectivos danos e perdas, numa atitude positiva que encara este período da vida como mais um momento desenvolvimental como todos os anteriores, em que se pode explorar as mais-valias e desfrutar e tirar partido dessa sabedoria que vem da experiência da vida longa. E sim, encontrar estratégias para minimizar as perdas e praticar actividade física adequada, que traga gozo e prazer. E que seja uma escolha livre e no sentido da saúde e do bem-estar. Não por obrigação ou por sucumbir às malditas pressões sociais e ao inferno dos outros, do que eles dizem e do que eles pensam. E isto quanto mais cedo melhor! Não pensem que é tarefa dos velhos e comecem já.
*Professora e investigadora no ISPA. Realiza investigação na área da
sexualidade, aliada à prática clínica que mantém desde 1997 como
psicoterapeuta. É membro da International Academy of Sex Research, foi
presidente da Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica e tem dezenas de
artigos publicados em revistas científicas internacionais. O que mais
gosta, é do trabalho clínico com os clientes, onde mais aprende e de
onde retira as questões que quer investigar.
IN "VISÃO"
27/06/16
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