29/04/2016

INÊS RAPAZOTE

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"Também somos portugueses.
Desculpe, Sr. Presidente"

Marcelo inaugurou os seu Portugal Próximo pelo interior alentejano. Quase 30 anos antes, Soares (o pai das Presidências Abertas) ouvira as mesmas queixas, por terras transmontanas

Jorge Libertado vestiu-se a rigor e pôs-se à porta da sua taberna com um livro e um saco com garrafas de vinho na mão. Quarta geração de taberneiros, sabia que Marcelo Rebelo de Sousa, à semelhança dos Presidentes anteriores, passaria por ali, ao terminar a subida pela Segunda Rua da Mouraria, em Moura. Também sabia que pararia. O que não sabia é que este Presidente lhe perguntaria, ao olhar para as garrafas, "então e não se bebe nada?"

Marcelo entrou (foi o primeiro Presidente da entrar na Taberna do Liberato) e bebeu vinho, provou o queijinho e ainda conseguiu que lhe oferecessem um bocadinho de presunto. Uma refeição completa para aquele que sobrevive com a campanhas eleitorais à base de sandwiches de queijo. Perante a generosidade do taberneiro, Marcelo disse "Ainda vai à falência!", mas Jorge Liberato respondeu com um mimo: "não com um Presidente como você, que dá força [à economia] para melhorar."

Depois dos comes e bebes, Marcelo seguiu caminho. O taberneiro ficou para trás, contente com a visita. "É como Mário Soares", diria finalmente à VISÃO.

De facto, como Soares, Marcelo fez furor na sua primeira presidência aberta, a que chamou "Portugal Próximo". Beijou crianças e velhinhas, deu "passou-bem" vigorosos, ouviu queixas, pedidos de ajuda e muitos elogios. "Cuidado que está mais magro", disseram-lhe em Évora. "Estou cansado, mas engordei um quilo", respondeu. A senhora nem ouviu, respondendo de seguida: "Olhe que eu não o quero lá um ano, quero-o lá dez anos!"

De tão à vontade, parecia que Marcelo está em Belém há anos. Exatamente como Soares, na sua primeira Presidência Aberta, em setembro de 1986, em Guimarães. Pelo interior alentejano, Marcelo disse e repetiu que quer um Portugal Próximo, sem desigualdades, porque "não há portugueses de primeira e de segunda", diria em Portalegre. "Há portugueses todos iguais e há grandes desigualdades. Uma das grandes desigualdades marcantes é entre quem vive no interior e quem vive no litoral."

Também Soares, há 29 anos, se deparou com a mesma questão. Foi na sua segunda Presidência Aberta (a segunda desde o 25 de Abril), em Bragança. "Nós também somos portugueses, desculpe Sr. Presidente", exibiam os alunos de uma escola primária do distrito. A mensagem estava colada a uma placa de sinalização "STOP" criada de propósito para fazer parar a caravana presidencial, que passava pelas estradas do interior transmontano. Soares engraçou com a situação.

Quase 30 anos depois não houve "STOP's" improvisados, mas a mensagem mantém-se.

PS: Se em Moura compararam Marcelo a Soares, no Alqueva compararam-no com o Papa Francisco.

A AUTORA

Cresci entre Managua, Bruxelas e Lisboa e viajei pelo mundo fora sonhando em tudo o que poderia fazer, «quando fosse grande». O destino trouxe-me para Portugal e encarreirou-me para um curso de Comunicação Social - ao qual faltava amiúde para me enfiar nas redações. Viciei-me em fazer perguntas, nunca me cansei de ouvir respostas e convenci-me que é legítimo querer saber sempre mais. Quis ser cantora, fotógrafa de guerra, psicóloga, gestora e arquiteta. Sou jornalista, na VISÃO desde 1999, onde posso fazer de tudo isto um pouco.


IN "VISÃO"
28/04/16

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