12/08/2014

SOFIA SANTOS

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Sofia Santos





 Portugal em 2030: 
ecológico, inovador 
e humano

Estamos em Dezembro de 2030. O meu filho fez 18 anos e o tempo passou a correr. Agora com 56 anos, olho para trás e constato que estes foram também os anos de amadurecimento da democracia portuguesa.

Em 2012 vivíamos uma fase de recessão económica, tendo o FMI, o Banco Europeu e a União Europeia, conhecidos como a ‘troika', entrado em Portugal para gerir a nossa economia.

Talvez por ingenuidade - em 2012 eu tinha apenas 38 anos e só conhecia a democracia Europeia - o desempenho da tal ‘troika' deixou-me anémica. No início de 2012 a dívida pública estava nos 108% do PIB, e em Maio de 2014, quando a ‘troika' saiu de Portugal, essa dívida estava a caminho dos 130%. 

 Tínhamos deflação e uma taxa de desemprego na ordem dos 15%. Na Europa existia uma guerra entre a Rússia e a Ucrânia que não era reconhecida pelos líderes europeus. A Europa também estava em crise. Algo tinha corrido muito mal. Nascida em 1974, foi-me incutido que quem trabalha e estuda consegue melhorar de vida, que é importante preocuparmo-nos com os outros e que o futuro é algo que devemos acautelar. 

Chegados aos meus 40 anos, com 18 anos de experiência profissional iniciada na city de Londres, com mestrado e doutoramento de universidades Inglesas, criado as minhas próprias empresas e uma ONG, escrito livros e artigos em jornais nacionais, constatei que, em 2014, Portugal não valorizava as minhas competências. Apesar de não conseguir trabalhar num sistema bloqueado e antes de sair de Portugal, decidi voltar a tentar. Lembro-me de um amigo meu dizer "Estás sempre a começar do zero, não estás?", e eu ter respondido "Não concordo. Aprendo com os vários projectos que desenvolvo, uns falham, outros têm bons resultados e, como tudo na vida, a incerteza é a única constante."

Até 2014 tinha trabalhado em 13 locais diferentes, era sócia de duas empresas de consultoria na área da sustentabilidade e analisava a possibilidade de criar mais 2 negócios concretos. Já tinha visto muita coisa. Muitos erros a repetirem-se devido à falta de experiência, à falta de intuição e à cegueira da surdez. Estava farta. Fartíssima de ver pessoas que, sem competências, conseguiam ter o poder para nada mudar. Fartíssima de não ser valorizada pelas universidades, apesar de o ser pelos alunos. Tinha perdido o respeito pelo sistema. Tinha receios, mas já não tinha medo.

Apesar de tudo isto, conseguia ver o potencial de Portugal. Conhecia vários empreendedores que conseguiam ser felizes desenvolvendo os seus projectos em ilhas isoladas; conhecia um empresário que me estendia a mão; tinha uma vasta rede internacional de contactos que asseguravam a minha saúde mental; tinha amigos que me davam força e, acima de tudo, tinha um filho e queria que ele, um dia, sentisse orgulho de me ter tido como mãe. E por isso, voltei a tentar. Desta vez o universo também ajudou. 

No Verão de 2014 iniciou-se um processo de limpeza em Portugal. A corrupção instalada no poder político e empresarial levou um forte abalo, que se iniciou com o fim do Grupo Espírito Santo, e que abalou muitos outros ex-presidentes de empresas, desde telecomunicações, construtoras, energia, futebol, retalho, entre outras. Em simultâneo, e uma vez que no ano seguinte iríamos ter legislativas, surge o que há muito defendia: os novos candidatos a líderes do PS e do PSD afirmaram que iriam fazer um acordo de regime a 10 anos. Finalmente o bom senso tinha retomado! As legislativas de 2015 foram marcadas pela menor taxa de abstenção dos últimos 30 anos. A campanha dos dois líderes foi feita em conjunto. 

Todos sabiam que o governo iria ter membros do PS e do PSD, sendo do conhecimento público quem iriam ser os futuros ministros e secretários de Estado. Esta foi uma mudança fundamental em prol de um regime político assente na integridade das pessoas. Estes 10 anos de pacto permitiram que as equipas governamentais tivessem sido constituídas por pessoas mais velhas, sérias e com experiência política, e por jovens (de 40 anos ou menos) criativos, preocupados com o futuro e com uma nova visão do mundo e das relações entre as pessoas e os países. 

A capacidade de diálogo e de cooperação entre os partidos políticos e os deputados cresceu de forma significativa. Este contexto permitiu que Portugal, talvez inspirado na Costa Rica, tenha apostado, a partir de 2015, na economia verde como o motor do desenvolvimento. Criou igualmente um enquadramento fiscal que favoreceu o surgimento efectivo do empreendedorismo e das micro empresas. Finalmente as novas empresas criadas teriam um regime fiscal diferente durante os primeiros 5 anos de actividade. 

O imposto sobre o trabalho desceu, e o imposto sobre a especulação financeira foi aprovado. Algumas das empresas financeiras tradicionais que não se conseguiram adaptar, tiveram de fechar. Mas muitas outras novas organizações surgiram, tendo-se criado um outro enquadramento onde uma nova economia floresceu.

Também no ensino existiram grandes mudanças. Acabaram-se as aulas de hora e meia e passámos a ter aulas de 60 minutos, onde os alunos falavam mais da matéria do que os professores. A vida escolar passou a incluir actividades que promoviam "a consciência do eu responsável" e a importância que "a partilha" e o "bem comum" têm para o progresso civilizacional das nações. 

Os primeiros resultados estão à vista. Vários estudos revelam que agora, em 2030, mais de 60% dos jovens têm como objectivo profissional ter um impacte positivo na sociedade, e cerca de 55% afirmam que ter o melhor salário não é a sua prioridade quando identificam potenciais locais para trabalhar.

18 anos passam num instante. Portugal é hoje um país melhor. É considerado o país mais sustentável e ecológico da Europa; as empresas mais inovadoras a nível internacional escolhem Portugal para desenvolverem os seus projectos pioneiros; os melhores académicos americanos e asiáticos querem vir trabalhar para Portugal, uma vez que a qualidade de vida e a efervescência inovadora associada a uma cultura ecológica proporciona um enquadramento único ao pensamento. Neste País os recursos naturais e o clima são uma dádiva. E as pessoas são humanas. Ainda bem que fui resiliente e optimista!

IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
05/08/14




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