06/10/2013

EVA GASPAR

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A austeridade 
que rende votos

Há uma constatação nova que se pode retirar do que se passou neste domingo: fazer e prometer fazer uma gestão prudente das finanças públicas passou a fazer parte no discurso de quem faz política à escala local. Nalguns casos terá valido votos preciosos. 
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Muito europeísta e muita gente que pensa que Portugal ficará melhor fora do euro e até da União Europeia vem há muito tempo admitindo, com emoções naturalmente diversas, que mais cedo ou mais tarde os povos do Sul poderão rebelar-se contra a austeridade excessiva e acabar por morder a mão de quem os tenta levantar do chão, não obstante as condições extraordinariamente favoráveis actualmente previstas para os empréstimos europeus: taxa média de juro de 2,7% e prazo médio de vencimento de 20 anos (nunca tivemos credores menos merecedores de serem insultados de agiotas).

Os resultados das eleições que tiveram lugar nestas últimas duas semanas por esta Europa fora sugerem, porém, que os cenários de ruptura mais prováveis poderão ser precisamente os inversos.

Na Alemanha, é bem verdade que ficou ampliada a bancada parlamentar das forças políticas que construíram a Europa – CDU e SPD. Mas o AfD, o primeiro partido estruturado em torno do desmantelamento do euro, ganhou em escassos cinco meses de existência 4,6% dos votos, ficando a uma unha negra dos 5% que lhe permitiriam entrar no Parlamento. Formado por economistas, juristas e dissidentes da CDU de Angela Merkel, o partido liderado por Bernd Lucke considera que a introdução do euro foi um “erro fatal que ameaça o bem-estar de todos”, defendendo a saída da Alemanha do euro ou a reintrodução das moedas nacionais nos países menos competitivos, como a Grécia e Portugal, a troco do perdão da sua dívida.

Na Áustria, os partidos do “centrão” europeísta – SPÖ e o ÖVP – também conseguiram votos suficientes para renovar uma “grande coligação”, mas sustentada por uma magra maioria parlamentar. Obtiveram a menor votação conjunta desde a II Guerra Mundial, permitindo o crescimento do FPÖ, partido anti-imigração e anti-União Europeia, e a entrada no Parlamento de um também novel partido anti-euro, patrocinado por Frank Stronach, bilionário austro-canadiano, que recolheu 5,8% dos votos – ainda assim, bem menos do que os 16% que as primeiras sondagens aventavam.

Estes resultados tornam mais provável uma reflexão e debate consequentes sobre o fim do euro nos seus actuais moldes provocados pelo centro – não pela periferia, onde uma coligação de interesses depende muitíssimo de se definir, à priori, um “inimigo comum e, sobretudo, da percepção da dimensão do "exército" disposto a combate-lo. O projecto morrerá inconsequente se se perceber que há menos gente do que se supõe disposta a morder na mão de gente que vive mais a Norte. E haverá menos gente se, entretanto, cada vez mais se derem conta de que a mão mais culpada estará, afinal, um pouco abaixo do cotovelo de cada um de nós. E é aqui que entram as autárquicas.

Sem pretender extrapolar conclusões para o plano nacional ou para o que poderão ser os resultados as eleições europeias da próxima Primavera, há uma constatação nova que se pode retirar do que se passou neste domingo: fazer e prometer fazer uma gestão prudente das finanças públicas passou a fazer parte no discurso de quem faz política à escala local. Nalguns casos terá valido votos preciosos.

No Porto, Rui Moreira avançou para a Câmara com o objectivo de preservar as “boas contas” e venceu com um discurso contra as propostas “populistas e irrealizáveis” do candidato do PSD. Em Lisboa, a proposta de Fernando Seara de cavar mais um túnel e mais dívida também não terá ajudado a roubar votos a António Costa. Em Leiria – terra onde um mega-estádio, onde se chegou a jogar à bola, quase engoliu o Castelo e ainda engole 5 mil euros diários em juros da dívida contraída para a sua renovação aquando do Euro-2004 – Raul Castro, do PS, reconquistou o voto de muito eleitor porque, não fazendo obra, aliviou em 30% o endividamento da autarquia.

Depois, é bem verdade, há sempre notórias - e não tão escassas - excepções. Como a de Oeiras dos tiques farónicos, do SATU e dos parques povoados muitas vezes com mais estátuas do que gente, onde 78 mil ficaram em casa e 23 mil deram a vitória a uma sequela medíocre de Isaltino Morais que promete levar o concelho mais à frente com fundos europeus que difícil – e felizmente – voltará a ter.

IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
03/10/13

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