Superando os conflitos
de soberania da
Ásia Oriental
A menos que a China demonstre que pode viver
pacificamente com os seus vizinhos, será colocada em dúvida a
reivindicação do seu governo de que a comunidade internacional não tem
nada a temer em relação ao crescente poder do país.
A
recente elevação das ilhas Diaoyu a “interesse principal”, como
reivindicação da China, tornou as perspectivas para a resolução da sua
disputa de soberania com o Japão, que governa as ilhas, ainda mais
complicadas. De facto, a recente publicação no “People’s Daily” do
comentário de dois estudiosos chineses a questionar a soberania do Japão
sobre Okinawa, sugere que as autoridades têm pouco interesse em
terminar as disputas em breve. Assim, com a China a endurecer as suas
múltiplas reivindicações de soberania em todos os mares do sul e oriente
da China, pode ser encontrado algum mecanismo para resolver estes
conflitos pacificamente?
As disputas em relação à soberania
territorial são, talvez, o maior espinho de todos os desacordos
diplomáticos. Podem parecer intratáveis, porque estão directamente
ligados não apenas ao orgulho nacional, mas também à segurança nacional.
Assim, não é uma surpresa que os governos sejam habitualmente
relutantes a seguir os mais pequenos passos para resolver estas
disputas. Receiam não apenas o recuo político doméstico, mas também as
perspectivas de que o seu adversário, ou adversários, interprete a
intenção de se comprometer como um sinal de fraqueza e assim tornar-se
ainda mais exigente.
As actuais disputas de soberania nos mares do sul e oriente da China –
envolvendo a China, Taiwan, Japão, República da Coreia, Vietname,
Brunei, Filipinas, Indonésia e Malásia – são particularmente venenosas,
porque também acarretam o pesado fardo da injustiça histórica.
Os coreanos vêem a sua disputa com o Japão como um eco da longa e
amarga ocupação do império do Japão. A China associa as suas
reivindicações dos mares e do sul e oriente da China com o período mais
negro da sua história – o “século da humilhação”, quando os poderes
estrangeiros severamente impingiram a sua integridade territorial.
Actualmente, o crescimento económico e político extraordinariamente
rápido da China dispôs quer o governo quer o público a procurar a
reparação de velhas feridas desse período e a não oferecer nada em troca
ao longo do caminho.
Mas, na Ásia de hoje, o comportamento destes países em relação às
suas disputas de soberania e a forma como respondem às acções (e
inações) de outros terá um impacto decisivo na segurança e prosperidade
regional. De facto, estas disputas podem provar ser um teste decisivo à
sinceridade da China no que diz respeito ao seu compromisso com um
crescimento global pacífico.
A menos que a China demonstre que pode viver pacificamente com os
seus vizinhos, será colocada em dúvida a reivindicação do seu governo de
que a comunidade internacional não tem nada a temer em relação ao
crescente poder do país. E a destreza dos Estados Unidos em resolver
estas disputas vai ajudar a determinar se a estratégia da América de
“pivot para a Ásia” contribui para moldar uma ordem de segurança
regional que é aceitável para uma China cada vez mais assertiva.
Porque as negociações bilaterais decorrem com um grande risco de
“perder a face”, as discussões multilaterais oferecem provavelmente as
melhores perspectivas de resolução para as disputas de soberania da Ásia
Oriental. O problema é que a China não apenas está pouco habituada a
procedimentos multilaterais, mas recua a partir deles. A história da
China não está preparada para trabalhar neste enquadramento e o seu
anseio por “status” – ainda mais pronunciado agora do que quando era
pobre – fará com que seja difícil que a China aceite uma solução
multilateral.
Como resultado, a China, que está particularmente preocupada em
manter os Estados Unidos fora das negociações, prefere perseguir
discussões bilaterais, sabendo perfeitamente bem que uma abordagem como
esta vai invariavelmente criar um jogo de soma nula no qual um lado pode
ser retratado como estando a proteger o seu interesse nacional e o
outro como estando a trai-lo. A China vai precisar de uma convicção
considerável se for para participar num enquadramento de consulta,
coordenação e compromisso de política regional com o objectivo de
silenciar as tensões em torno das disputas de soberania. Mas, a menos
que a China seja trazida para este enquadramento, o seu sentido de
isolamento vai crescer, bem como a tentação para definir os seus
interesses de modo que sejam irreconciliáveis com os dos seus vizinhos.
Não surpreendentemente, tendo em conta as suas próprias estruturas, a
União Europeia (UE) prefere a abordagem multilateral. Desde 1995,
quando a China ocupou o recife de Mischief, uma zona marítima reclamada
pelas Filipinas, a UE encorajou a Associação das Nações do Sudeste da
Ásia para reforçar o seu código de conduta para a região.
Mesmo começar a falar sobre uma solução regional para as disputas de
soberania da Ásia Oriental, contudo, requer preparar o caminho. O
primeiro passo deve ser reduzir as tensões diplomáticas. Felizmente,
isso parece estar a ser colocada no lugar. Tendo ido para a borda, os
líderes quer da China quer do Japão parecem ter tomado uma mão directa
na suavização da retórica dos seus países.
Mas, ninguém deve pensar que esta redução da temperatura seja
permanente. Outros passos são necessários para criar hábitos de
diplomacia civil em torno das reivindicações territoriais polémicas.
Aqui, a “Iniciativa de Paz no Mar da China Oriental” do presidente do
Taiwan Ma Ying-jeou, que apelou a todas as partes para refrearem os
seus comportamentos antagónicos, resolvendo as disputas com meios
pacíficos e estabelecendo um código de conduta para a cooperação no Mar
da China Oriental, é um claro passo em frente. Ainda que a disputa de
soberania do Taiwan com o Japão em torno das ilhas de Diaoyu (chamadas
de ilhas Senkaku pelos japoneses), envolve reivindicações
não-negociáveis, os recursos em torno da ilha podem ser, no entanto
partilhados, alimentando os hábitos de uma cooperação regional mais
próxima no processo.
A abordagem construtiva de Ma para reduzir as tensões na região
beneficiaria todas as partes envolvidas. Embora os adversários possam
não alcançar um acordo no curto prazo na questão da soberania, deverão
ser capazes de encontrar uma fórmula que lhes permita partilhar os
recursos naturais, ou outros, das ilhas e das águas vizinhas.
A Europa viveu algo similar com a partilha de recursos no Mar do
Norte. O Japão e o Taiwan já começaram, ao longo de uma estrada
paralela, as suas negociações sobre pesca. É agora tempo de que a China e
o Japão, as economias soberanas da região, coloquem a prosperidade e
segurança das suas populações primeiro no interesse de um
desenvolvimento partilhado bem-sucedido.
www.project-syndicate.org
* Coordenador de Assuntos Externos dos Conservadores e Reformistas Europeus no Parlamento Europeu.
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
04/07/13
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