10/02/2013

CARLA HILÁRIO QUEVEDO

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O amor dela e ela 

 “Ninguém tem nada a ver com isso, ninguém tem nada a ver com isso, a não ser o meu amor e eu” 

Ando hipnotizada com o refrão de “Nobody’s Business”, de Rihanna com Chris Brown, que diz que “ninguém tem nada a ver com isso, ninguém tem nada a ver com isso, a não ser o meu amor e eu”. O tema é um comentário ao caso de violência doméstica do qual Rihanna foi vítima há quatro anos. Em Agosto de 2009, Chris Brown admitiu a culpa e foi condenado a uma pena de cinco anos de prisão com pena suspensa e a 1400 horas de trabalho comunitário. Rihanna foi, na altura, testemunha de acusação no processo e o relacionamento entre os dois chegou ao fim.

À semelhança do que se acontece em muitos casos, mas também, felizmente, ao contrário do que se passa em tantos outros, a mulher espancada voltou para os braços do agressor. Depois de uma série de peripécias, como entrevistas em directo com Oprah Winfrey, cancelamentos de espectáculos de Chris Brown na sequência de manifestações de movimentos defensores dos direitos das mulheres, e até um ataque no Twitter por parte da comediante Jenny Johnson, que levou a que o cobardolas Brown apagasse a sua conta, Rihanna apareceu há dias de novo em tribunal, desta vez para apoiar o agressor, com quem entretanto reatou. Ao que parece, o serviço comunitário devido não terá sido cumprido e, o pior, há suspeitas de fraude por parte do condenado. Nas datas em que diz ter cumprido a sentença, Brown terá estado noutros locais. Há ainda registos de outros incidentes. Há pouco tempo terá agredido e ameaçado Frank Ocean num estúdio de gravação em Hollywood, contou mal uma história com marijuana e não hesitou em mostrar a sua sordidez verbal no episódio no Twitter que mencionei. O tribunal também ordenara em 2009 que Brown se mantivesse afastado de Rihanna, o que não aconteceu.

A violência doméstica é um problema social grave, mas apesar de tudo pouco falado. As campanhas de alerta para o problema parecem ter resolvido uma parte da questão. As mulheres denunciam hoje mais do que dantes, mas infelizmente continuam a sofrer e a morrer às mãos dos que deviam ser seus cúmplices numa vida de paz. Quando Rihanna canta que ninguém tem nada a ver com a vida dela até pode ter razão em geral, mas não no ponto determinado pela lei. Ninguém tem uma liberdade total sobre si, e esta realidade não é tão má quanto se possa pensar. Mesmo os mais respeitadores da liberdade individual não questionam leis que protegem as pessoas de causar mal a si próprias. Não querendo de modo nenhum “culpar” a vítima, é possível que estejamos perante um caso em que a mulher é, por assim dizer, inimputável face à sua vida.

A questão é delicada e complexa, não apenas legal, por isso as campanhas contra a violência doméstica têm um efeito tímido. Cada caso terá as suas especificidades, mas neste, que envolve figuras públicas conhecidas em todo o mundo, jovens e com a vida pela frente, é compreensível que toda a gente, no mundo inteiro, se meta. Os fãs e o público em geral não aceitam que uma mulher se esqueça do estado esmurrado em que ficou. Nem quando ele canta “deixa-me amar-te e mostrar-te como és especial” Rihanna se lembra do seu passado recente num Lamborghini alugado. Se calhar não há solução.


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09/02/13

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