05/01/2013

RAQUEL GONÇALVES

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Vai passar

 O João faz hoje 17 anos. O menino de olhos grandes e de coração ainda maior cresceu de corpo e alma, a comprovar esse tempo que segue independente da nossa vontade. As crianças, todas elas, provam-nos esse pulsar que não pára, essa passagem dos dias, dos meses, dos anos, de todas as horas em que a memória se instala. São elas as depositárias de uma certa força telúrica e de uma magia que se opera em tudo o que muda e fica e perdura.
É da natureza do tempo estas pequenas grandes mudanças que nos assaltam em sobressalto feliz. Essa surpresa dos meninos que pulam da infância para um outro lugar e que nos surgem, assim, homens inteiros, mesmo quando lá no fundo as nossas mãos e o nosso coração ainda embalam um outro tamanho de ternura e de afectos.
E se falo do João e dos seus 17 anos não o faço apenas por ele, embora já fosse tanto e muito e ainda mais, falo por essa esperança que vive nesse inexorável passar do tempo e na certeza de que tudo avança, nessa natureza que é mais forte do que todas as pedras, toda a água, todo o vento que nos transporta. O tempo é sempre a força mais forte, a vontade mais dura, a certeza mais certa.
É verdade que, às vezes, como agora, parece que tudo acaba, que é possível suspender a vida numa mágoa infinita, num desamparo sem fundo, numa desesperança surda de gritar alto.
Sim, vivemos um tempo que parece ter o poder de nos anular quase por completo, de nos colocar nesse ponto de não retorno. Mas este tempo, como todos os outros, obedece a um movimento maior que impele para a frente, sempre para a frente. É uma incógnita esse caminho que se desenha para lá do que podemos ver e sentir com a pele e com a vontade, mas está lá à espera de ser ocupado, vivido, tomado de assalto por essa surpresa que é a vida, toda a vida de que somos capazes.
Pelo meu João, por todas as crianças de cada um e de todos, pelo tempo, pela memória e pela surpresa do que ainda não se desenha em nós, há que acreditar que tudo continua, e passa e surge e acontece.
É assim como quando uma queda na infância nos esfolava os joelhos, que ardiam e arrancavam aquele choro do fim do mundo. E depois, depois vinha o tempo, o beijo da mãe a promessa de que "vai passar" e passava mesmo, com o tempo, os dias, uma nova queda, uma nova dor e também muitos sorrisos e alegrias de fazer doer a barriga e crescer os braços e as pernas para ser possível chegar a sítios cada vez mais altos.
É mesmo assim, vai passar...
A todos a esperança de um novo ano e de uma felicidade que é possível e certa como o tempo que passa. Vai passar...

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS DA MADEIRA"
30/12/12

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