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PROFESSORA
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS DA MADEIRA"
05/11/12
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A normalidade
da anormalidade
?(...) Não sou daqui e não vos devo nada, ninguém
poderá negar a evidência de ser chama ou água, fluir em lugar de ser
pedra. Perdoai-me a transparência."
Eugénio de Andrade
Eugénio de Andrade
Estamos a meio do primeiro período escolar do ano lectivo 2012/2013. O
período que teve início no dia 17 de Setembro p.p. e tem o seu fim
marcado para o dia 18 de Dezembro. Estão percorridas sete semanas desde
do início do mesmo e faltam sete para o seu término. Tendo em conta que,
em média, os nossos alunos têm 22 horas lectivas por semana, até ao
momento já tiveram 770 horas de aula o que equivale a, aproximadamente,
32 dias ou, se preferirmos, a 46200 minutos. Vamos imaginar - sim
estamos a 'imaginar' - que, ao longo deste tempo lectivo, alguns destes
estudantes não têm material de estudo pois existe um atraso na entrega
dos manuais escolares ao abrigo da acção social. Se continuarmos este
exercício de 'imaginação' e pensando numa turma onde, apenas, metade dos
alunos têm livros, este exercício de, pretenso, imaginário, tinge-se de
cores negras que pintam uma realidade angustiante.
Relativamente ao atraso na entrega dos manuais o secretário da
Educação afirmou que "o processo está a ter um seguimento normal
adequado aos tempos que vivemos". Vem esta argumentação ínvia do
responsável máximo deste processo. Um responsável, completamente alheado
da realidade, a não ser que, na sua realidade, seja normal, em pleno
século XXI e a meio do 1º período lectivo, ainda haver muitos alunos sem
manuais escolares; que seja normal que o número de fotocópias a que os
professores têm direito se esgotem nos primeiros dias de cada mês por
forma a minimizar os efeitos "do processo que está a ter o seguimento
normal". E que seja perfeitamente "adequado aos tempos em que vivemos"
haver uma discriminação, vergonhosa, que sujeita os alunos que
beneficiam da acção social. É "adequado" que estes alunos, provenientes
de famílias de baixos recursos, sejam prejudicados no desenvolvimento,
esse sim, normal, das aprendizagens por não terem livros. É "adequado
aos tempos que vivemos" esta nova forma de exclusão precoce. É "normal e
adequado aos tempos que vivemos" que alunos estejam durante 770 horas
sem manuais escolares no meio de um processo de ensino aprendizagem! E
ainda se admiram dos lugares que ocupamos nos rankings, valendo estes o
que valem.
A normalidade da anormalidade continua quando verificamos que há
escolas sem telefones, que existe falta de transportes escolares, que o
S. Pedro inunda salas de aula, refeitórios e pavilhões em estruturas
antigas e obras da "Madeira nova".
A solução para isto passa pelo elogio, pungido e constrangedor, aos
docentes, incitando-os e, simultaneamente, responsabilizando-os pela
resolução dos problemas que o próprio não consegue e não quer resolver.
Sim, os docentes são empenhados, abnegados e têm espírito de entrega às
causas que abraçam. Mas colocar nos seus ombros a responsabilidade de
resolver os graves problemas que afectam as escolas é obsceno.
Os docentes viram os seus salários serem reduzidos sem pudor;
serem-lhes roubados os subsídios de férias e de Natal e, ainda assim,
espera-se que tenham disponibilidade financeira para sustentarem as
escolas. Do seu bolso, cada vez mais magro, confia-se que saia o
pagamento das fotocópias necessárias para que os alunos que não têm
livros consigam acompanhar, minimamente, o avançar dos conteúdos
programáticos, já que o rácio, definido a régua, esquadro e calculadora,
não pode ser ultrapassado. É caso para perguntar o que teria de
acontecer para que o secretário da Educação considerasse anormal.
Numa região com 58 mil pessoas sem instrução é urgente e necessário
um sobressalto cívico em defesa da qualidade da escola pública.
PROFESSORA
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS DA MADEIRA"
05/11/12
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