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IN "AÇORIANO ORIENTAL"
28/09/12
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Literatura
Esta semana, Mario Draghi, Presidente do Banco Central
Europeu, afirmou que o problema dos países europeus que se encontram em
crise é resultado “das más políticas dos últimos anos e da total
ausência de uma política económica.”
Pouco depois de ouvir estas palavras, andava eu por um Centro
Comercial e deparei-me com uma vulgar montra de uma casa comercial sem
grande nome, com malinhas de senhora ao módico preço de mil euros cada.
Como é que num país em crise como o nosso, em que o ordenado mínimo
baixa para menos de 400 euros, em que centenas de pais retiram os filhos
dos infantários porque não têm como os pagar, em que centenas de
pessoas perdem os empregos… encontramos malas de prêt-à-porter a este
preço? Foi então que me ocorreu uma frase de um colega de Economia:
quando um país está em crise, há sempre uma pequena franja da população
que enriquece muito.
Em Portugal, todos sabemos quem é a “franja”. É aquela a quem
apontamos o dedo e, simultaneamente, baixamos a cabeça. Não tem só uma
cor política – e nisto Mario Draghi tem razão. Pode Portugal mudar de
governo, mas de política de fundo não tem mudado. O cidadão comum faz
piadas acerca disto, pondo na internet as frases que Passos Coelho dizia
na sua campanha eleitoral e as frases contraditórias que diz agora que é
Primeiro Ministro; as promessas de jamais aceitar os pacotes de
austeridade negociados entre Sócrates e a troika versus o país retalhado
aos bocadinhos e a austeridade cada vez mais apertada. Este é o cidadão
comum com sorte, que tem internet e riso para fazer piadas, é aquele
que tem força. Há os que já não riem e acham que manifestar-se é utopia;
ao falarem de revolução dizem que “o 25 de Abril foi bem sucedido mas
foi porque estávamos fartos da Guerra, da Guerra a sério e ninguém gosta
de matar e morrer.”
Os espanhóis, tradicionalmente mais ferventes, começaram a
manifestar-se com violência antes que Espanha peça qualquer resgate,
imputando ao seu também recente governo falta de legitimidade
democrática porque “foram enganados” enquanto eleitores.
A Grécia também mudou de Papandreou para Samaras e continuou na escala de cortes económicos e violência nas ruas.
Reconheço razão ao BCE: todos nós enquanto países andamos de salvador
em salvador da pátria… para continuarmos nas mesmas políticas de
afogamento de nações.
Hoje, ninguém acredita em Portugal. As pessoas têm vergonha de serem
portugueses. Dizem “sou português” ao pé de um estrangeiro como se fosse
uma fatalidade. Só a já longínqua história dos Descobrimentos os anima,
essa lembrança antiga de que já foram grandes. Parece impossível que
Portugal tenha começado porque um rapaz chamado Afonso Henriques tenha
decidido levantar espada contra a sua poderosa mãe. Hoje, nem a voz se
levanta. Toda a gente tem medo e falta de ânimo. Poucos se lembram que
todos os poderes são efémeros e que maiores impérios neste mundo já
caíram.
Nada melhor, porém, do que ouvir hoje Passos Coelho citando Os
Lusíadas como metáfora para o tempo que atravessamos, pois “por pior que
seja a tormenta que nos arrasta para trás, temos sempre ventos
favoráveis a soprar nas nossas velas.” O Sr. PM esquece o que qualquer
professor sabe: que não se pode falar nunca de Literatura a quem não
pôde tomar o pequeno-almoço em sua casa.
IN "AÇORIANO ORIENTAL"
28/09/12
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