15/03/2012

FERNANDA CACHÃO



 A promessa 
      e a ameaça


O relatório do Eurostat que nos cegou com o aumento da taxa de desemprego para 14,8 por cento também dizia que em Portugal há mais pobres. As instituições de solidariedade social e a Igreja julgam que já se atingiu a barreira psicológica de um quarto de portugueses a viver com rendimentos abaixo do salário mínimo nacional. E, no entanto, há três anos, já 21 por cento da população tinha pouco.

O empobrecimento nacional tem tido a discrição de uma infiltração doméstica. Corre e arrasta--se há muito, e agora, que demos com o problema, estamos apenas no início das obras.

Do tempo do Portugal portugalinho, pequenino e pobrezinho, ficaram--nos tiques. O país vaidoso e desleixado que sobreveio nas décadas seguintes a 1974 continuou a virar o colarinho esgarçado para que a camisa parecesse nova – até deixar de ter o que vestir.

Chegámos à crise oficial com um ministro de falas mansas que diz que a austeridade é boa para que não tenha de haver mais e maior austeridade. É pedido o sacrifício colectivo pela salvação nacional. A frase de Vítor Gaspar faz lembrar o tempo em que se punha álcool nas feridas das crianças. A promessa era também gémea da ameaça, pois o que arde – diziam – cura. 



IN "CORREIO DA MANHÃ"
06/03/12

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