Olá Caixa, adeus EDP
Responda num segundo: quem é o maior accionista privado da EDP? Agora noutro segundo: quem é o novo presidente executivo da Caixa? Se precisou de tempo, não cobre à memória. Um ninguém conhece, do outro ninguém se lembra.
São duas escolhas muito relevantes, a da nova administração da Caixa Geral de Depósitos e a do modelo de privatização da EDP. Ambas foram assinadas pela mão do primeiro-ministro. Ambas têm o dedo do ministro das Finanças. Vítor Gaspar foi claramente subestimado ao início.
A Caixa Geral de Depósitos passou a ser liderada por três "sensibilidades": o "chairman" Faria de Oliveira, próximo do Presidente da República; o CEO que ninguém conhece, escolhido pelo ministro das Finanças; o número dois, Nogueira Leite, próximo do primeiro-ministro.
Esta visão divisionista é a pior: esperemos que o PSD não queira fazer de Nogueira Leite o que o PS fez de Francisco Bandeira: o infiltrado. A tarefa do banco é demasiado importante para curtos-circuitos, e a verdade é que Nogueira Leite tem reputação e pensamento próprios. Já Faria de Oliveira ganha o lugar que propôs, "chairman", depois de se mostrar mais poderoso do que se julgava: foi ele quem impediu que o Governo PS renovasse o mandato da administração da Caixa antes das eleições.
Só quando soubermos a lista final da Caixa perceberemos os seus equilíbrios. Mas, com certeza, a administração executiva será menor, até para provar que os não executivos não estão numa nova prateleira dourada.
O mais importante nesta escolha da Caixa é, todavia, outra coisa: a visão financeira, em vez de económica, que parece ir dominar. O Banco de Portugal exportou há um mês o ministro das Finanças e agora o presidente da Caixa. José Agostinho de Matos, que toda a gente vai passar a conhecer, provavelmente nunca teve uma reunião com um cliente na vida mas porta a visão de cumprimento estrito do plano da troika. Isso inclui vender todas as participações não financeiras, e depressa: EDP, Zon, PT, Galp, etc. Mas também deixar cair credores famosos e falidos da gesta PS, o mais reputado dos quais é Joe Berardo. Outras empresas para quem houve simpatias, como a Martifer ou a Visabeira, podem arrepiar caminho.
Se dúvidas havia quanto à visão liberal do Governo, a privatização da EDP esclarece. Não há cá "fatias" de 5% para dividir o poder por muitos e, portanto, mantê-lo em quem está: o BES, os Mello e cunhas do Governo. Não: a privatização vai criar um bloco de 20%, o que significa, sem qualquer dúvida, a venda a um estrangeiro do controlo da EDP - e o que maximiza o valor da venda em várias centenas de milhões de euros. Depois dessa operação, ou há aumentos de capital que os portugueses não podem acompanhar, ou OPA, ou a empresa é vendida às postas. Mas não duvide: o "P" de EDP passará a ser uma relíquia como o "por" de Cimpor já o é. Porque o maior accionista privado da EDP já é estrangeiro, a Iberdrola, mas é como se não existisse: não manda.
De futuro analisaremos melhor a privatização da EDP, que vai levantar polémicas e os medos proteccionistas do costume. Para já, fica isto: há mesmo um choque liberal que desponta. Ele tem como epicentros o primeiro-ministro e o Banco de Portugal, que tomou o Ministério das Finanças e a CGD. Se ninguém os parar, não restará pedra sobre pedra no edifício político, financeiro e empresarial que se alojou a engordar nos defeitos da economia portuguesa. Assim seja: que ninguém os pare.
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
22/07/11
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