Recrutam-se Políticos (M/F)
Em tempo de crise, a nossa melhor arma é a exigência.
Alguém já viu um anúncio de emprego na imprensa portuguesa para assessor do Primeiro Ministro? E para presidente de uma empresa estatal? As pessoas que detêm o monopólio da actividade política são geralmente recrutadas e treinadas por partidos políticos. Ainda que a escolha de muitos cargos seja feita pelo eleitorado, a lista dos selecionáveis é formatada à priori pelos partidos. Só podemos escolher entre aqueles que alguém já escolheu. Como garantir, assim, a capacidade dos que nos representam?
A resposta pode ser a profissionalização do recrutamento. Qualquer empresa de topo tem departamentos de recursos humanos ou contrata empresas de head-hunting (caça cabeças ou caça-talentos, em tradução livre), especializadas na procura de profissionais talentosos. Porque não aplicar alguns destes princípios à política? Teríamos certamente algumas vantagens. Em primeiro lugar, aproximaria a classe política do seu eleitorado. Um dos fenómenos mais recorrentes na Europa é o crescimento galopante da abstenção e dos votos brancos em actos eleitorais, em muitos casos como estratégia de contestação contra a qualidade do serviços prestados pela classe política. Em segundo lugar, a qualificação profissional dos políticos leva a melhores resultados nas urnas. Uma estudo recente feito pela London School of Economics demonstrou que quanto mais apurado for o processo interno de selecção de um candidato político (nomeadamente através de eleições primárias), mais expressiva é a sua votação. Em terceiro lugar, deveremos pensar, sobretudo, no interesse nacional. O desenvolvimento social e crescimento económico de um país, não esta só dependente de boas instituições, mas da qualidade da classe política. E nem precisamos de pesquisas para o demonstrar.
Presidentes do Conselho de Administração de empresas como a Nokia, HP ou Coca-Cola foram selecionados através de head-hunting e passaram por um rigoroso processo de filtragem e de entrevistas. Noutros países, como a Nova Zelândia ou o Reino Unido, presidentes de empresas estatais são igualmente selecionados através de concursos. E já não são raros os casos em que a cargos séniores no sector público-político são recrutados através de empresas de recursos humanos. Na Índia, país que, como Portugal, dispõe de uma população jovem muito qualificada e de uma classe política envelhecida e imóvel, o estado de Uttar Pradesh, o mais populoso, tem organizado vários concursos públicos para cargos político-partidários. Nos Estados Unidos, é comum, logo após uma eleição, abrirem-se concursos para preencher os lugares no sector público deixados vagos pela administração anterior. O recém-eleito Governador da Flórida, Rick Scott, acabou de contratar uma das maiores empresas de head-hunting "para recrutar as pessoas mais qualificadas no mercado de trabalho para implementar as minhas políticas de governo" afirmou à imprensa.
Inquestionavelmente, para a maioria dos cargos políticos o critério da lealdade pessoal ou ideológica deve ser considerado. Também é verdade que todos os grupos sociais, independentemente dos diplomas e das medalhas, devem poder ter acesso ao poder. Mas isso não significa que deixemos de ser criteriosos. Em tempo de crise, a nossa melhor arma é a exigência.
* Pós-doutorado em Relações Internacionais pela Universidade de Columbia, EUA
IN "VISÃO"
26/04/11
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