Para onde?
O primeiro-ministro dirá: “profetas da desgraça.” Mas a realidade que aí vem vai ser mesmo muito, muito bruta.
Em Junho de 2008, escrevi nesta página que tinha passado a existir um novo conceito estratégico: o da reserva alimentar, e que urgia levá-lo a sério. A fome esteve sempre na origem de convulsões profundas. Como o desemprego e a repressão.
O mundo inteiro ferve: já não são só as notícias que nos chegam, todos os dias, dos países do Norte de África e do Médio Oriente, com graves conflitos, mortos e desalojados; protesta-se também na Índia e na China, e não vai parar.
Ouvimos comentários de analistas com experiência e formação. Entendemos que a mesma reacção se estendeu rapidamente a vários países, de forma incontrolável.
Sabemos que os países de que falamos são diferentes: mais ou menos ricos, mais ou menos populosos.
A diplomacia, as chancelarias, os serviços secretos parecem ter sido surpreendidos.
O que, numa primeira análise, há de comum?
Estamos a falar de países onde não existe Democracia, com graves desigualdades sociais, com fome e desemprego, principalmente entre uma população que é muito jovem, ao contrário da europeia. E a subida de preços, principalmente dos alimentos, agrava-se.
Como factor, e em parte aglutinador, surge um fenómeno com o qual não se contava há uns anos: as redes sociais. A informação deixou de estar controlada pelas oligarquias. A comunicação passou a ser livre, sem restrições, sem filtros, sem mesuras, não editada.
E a revolução veio para a rua, aparentemente sem directório, sem controlo. Não sabemos em que sentido caminharão estes povos.
E vê-se líderes, a quem há um mês todos pediam audiências e favores, como Kadafi, desesperados, a mandarem bombardear o seu próprio povo. Assistimos a repressões, à queda de regimes e mesmo a manifestações na Índia e até na China.
Claro que a escalada da violência em zonas tão sensíveis pode trazer consequências terríveis e globais para todo o mundo.
E nós, aqui? Verdade que vivemos em Democracia imperfeita. Mas verdade também que temos factores sociais que nos aproximam dos países a que nos referimos: desemprego, principalmente nos jovens, pobreza, desigualdades sociais, subida dos preços em bens essenciais e redes sociais (que já marcaram uma manifestação para o dia 12 de Março).
O primeiro-ministro, em constante campanha eleitoral, dirá: "profetas da desgraça, traidores à Pátria, gente sem educação", como sempre diz quando dele se discorda.
Mas a realidade que aí vem vai ser mesmo muito, muito bruta.
ADVOGADA
IN "CORREIO DA MANHÃ"
14/02/11
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