22/02/2011

ALMORRÓIDA TRAFICÁRIA



55% das mulheres nas cadeias portuguesas estão presas por tráfico

por Cláudia Garcia

A função da mulher portuguesa nas redes de tráfico tornou-se secundária. A eliminação de bairros degradados tem ajudado a diminuir a quantidade de mulheres presas

Anabela, de 40 anos, é uma das 451 mulheres presas por tráfico de droga nas prisões portuguesas. Há quase dois anos no Estabelecimento Prisional de Tires, esta mãe de cinco filhos ainda tem esperança de conseguir sair em liberdade condicional a meio da pena. Em conversa com o i Anabela recorda o dia em que pegou num embrulho que o marido lhe pedira e lho levou à prisão onde estava detido. O agora ex-marido, pai de quatro dos seus filhos, recebia as visitas de Anabela quase todas as semanas. Numa dessas visitas a mulher acabou por ser detida. "Fui ingénua, ele disse-me que era dinheiro e eu acreditei. Era um pacote muito pequenino e como estava embrulhado nem deu para perceber. Levei normalmente e acabei por ser apanhada", conta.

Há 337 mulheres portuguesas presas por tráfico de droga no país. Para o especialista em direito criminal, Carlos Melo Alves, o caso de Anabela é comum, mas a condenação depende das variáveis: "Há as mulheres que levam droga para os maridos consumirem e há as que levam para eles traficarem." Neste caso é a mulher que corre mais riscos de ser condenada. "Na prisão há muita droga e ela tem de entrar de alguma forma. Durante as visitas, muitas mulheres levam droga", explica.

De acordo com o advogado, a maioria das mulheres portuguesas ocupam funções secundárias na cadeia do tráfico, sendo que as mais activas são de outras nacionalidades - há 114 mulheres estrangeiras detidas nas prisões portuguesas. Estas actuam como correios internacionais e vêm principalmente da América Latina, transportando pequenas quantidades de cocaína, heroína ou haxixe com destino a países como Espanha ou Holanda. Usam malas com fundo falso ou até o próprio corpo para fazer o transporte. "O mais comum é as mulheres servirem de correio. O homem assume mais frequentemente a função de liderança", explica Melo Alves. Os aeroportos são ponto de passagem de quantidades mais pequenas e, portanto, as mulheres detidas não transportam normalmente mais do que um ou dois quilos de cocaína.

Casos As suspeitas do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (a força policial que detém a maioria das mulheres por tráfico) recaem sobretudo sobre mulheres que chegam da América Latina e que, muitas vezes, dão nas vistas, frisa o advogado. Também ocorrem denúncias, mas há menos casos. "Quando a PJ intervém num aeroporto é porque já existe uma investigação."

Quando se trata de grandes quantidades, o transporte é feito por via terrestre, aproveitando os benefícios da livre circulação no espaço Schengen. Neste caso, são os homens a correr a maioria dos riscos ao transportarem toneladas de cocaína em camiões fechados.

Nos casos mais típicos, a mulher pode também colaborar com o marido ou o companheiro na cadeia do tráfico. Esse é um dos principais motivos que levam as mulheres a envolver-se nas operações, a par do dinheiro, ou ainda de medo face a ameaças de que costumam ser alvo.

A pena por este tipo de tráfico pode variar entre quatro e 12 anos de prisão. Apesar de as mulheres portuguesas se envolverem com funções de menor relevância nas redes de tráfico, conseguir uma pena suspensa é um objectivo difícil. Melo Alves recorda que a eliminação de bairros degradados, como foi o caso do Casal Ventoso, fez diminuir o número de condenações por tráfico: "Antigamente, as mulheres assumiam um papel de liderança naqueles bairros degradados, mas hoje têm uma posição secundária. Podem acompanhar o marido ou ser responsável pelo dinheiro - não fazem muito mais. Tenho várias clientes com função secundária", revela.

Penas Em 2007, a moldura penal para o tráfico de droga sofreu alterações e a pena suspensa, que antes só poderia abranger crimes com condenações até três anos, passou a ser aplicada em casos de pena até cinco anos. "Houve uma corrente de juízes na Boa-Hora que optavam por suspender a pena a muitas destas mulheres que faziam de correio", explica Melo Alves. Porém, em Abril de 2008, o Supremo Tribunal de Justiça defendeu a posição de recurso à pena efectiva nos casos de tráfico, considerando que os correios são também responsáveis pela circulação de droga. Hoje, conseguir uma pena suspensa é apenas possível em condições excepcionais.

Também no entendimento de Carlos Melo Alves, as dificuldades económicas não servem de desculpa, mas o advogado recomenda uma avaliação caso a caso.

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22/02/11

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