E se expulsássemos a Alemanha do euro?
A Europa não sabe por onde ir mas não pode ir por aqui. Berlim está em contraciclo. Há uma hipótese: a federação. Com ou sem os alemães
O euro não pode acabar. Os alemães detestam ter de pagar pelas dívidas dos países periféricos, mas seria ridículo abdicar do investimento de meio século no projecto europeu. Aos eleitores germânicos, indisponíveis para salvar países em pré-falência, devia ser explicado o básico: Berlim beneficiou substantivamente da moeda única e a política externa germânica assentou, nos últimos 50 anos, na integração europeia. A economia alemã precisa do euro e do mercado comum. Colocar em risco a maior zona económica do mundo seria um suicídio.
Dito isto, a crise do euro é real. A Alemanha até pode querer expulsar os maus alunos da zona euro. Sucede que os tratados não prevêem qualquer mecanismo de expulsão de um Estado-membro da união monetária. O que podem fazer os países acossados pela dívida? Aprender com os erros e perceber que chegaram aqui por culpa própria, pelo que o ajustamento terá de ser feito e irá de doer. Depois, podem tentar ver mais longe para unir esforços e resistir em nome da UE. Essa resistência tem um objectivo político: integração, união fiscal e federalismo.
A UE precisa de funcionar solidariamente, como aconteceu em 2003 quando França e Alemanha violaram o Pacto de Estabilidade e Crescimento. Além do controlo das taxas de juro, da inflação e dos défices orçamentais, a UE precisa de objectivos de política económica e de emprego, além de mecanismos eficazes de resgate dos Estados em falência iminente. A UE precisa de ter um Tesouro.
Os investidores que cobram juros astronómicos para financiar a dívida dos países em dificuldades olham para além do problema da liquidez. E duvidam que os devedores consigam pagar no futuro. Esse é o problema do euro.
Os resgates da Grécia e da Irlanda pela mão da troika UE, BCE e FMI, foram operações de refinanciamento que não resolveram o problema da insolvência. Não por acaso, os resgates estão a provocar o que pretendiam prevenir: a subida dos juros. Ou seja, não são credíveis. A receita germânica para lidar com a crise não funciona, como Martim Wolf já esclareceu. A deflação e o rápido ajustamento fiscal para combater os défices orçamentais precisam de uma contrapartida: o aumento exponencial das exportações. A Alemanha pode fazê-lo porque tem o mercado europeu; Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha dependem do resto do mundo. A crise sistémica do euro não se resolve injectando dinheiro localmente. Resolve-se atacando o centro do problema: os desequilíbrios de competitividade e produtividade e a distribuição assimétrica de rendimentos entre os membros da união monetária. Também convinha parar com a loucura de tapar buracos privados com dinheiros públicos. Angela Merkel tem razão quando diz que os credores têm de assumir uma parte das perdas. É inevitável.
Tal como as reformas estruturais são incontornáveis. Muitos países, como Portugal, precisam do BCE, ou do fundo de emergência europeu e do FMI para continuar a rolar dívida nos próximos anos. Mas, no máximo, conseguem ganhar tempo. O problema é que os cortes brutais no investimento, aliados aos cortes de salários e à asfixiante carga fiscal trazem a recessão económica e cavam ainda mais as assimetrias da zona euro. A prazo, os desequilíbrios podem condenar-nos a décadas de miséria. É por isso que, em última análise, ou a UE se federa ou se extingue.
Estará Berlim disposta a pagar o preço da extinção da união monetária para regressar ao marco? Se estiver, deveria receber a ameaça que está a fazer nos bastidores: ser expulsa do euro. França não se importará de liderar o bloco europeu e a Alemanha tem, de facto, mais a perder do que a ganhar.
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29/11/10
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