Promoções arriscadas e apostas
Se o PS arranjar uma saída airosa para Sócrates e eleger um líder credível ainda pode dar dores de cabeça ao PSD em futuras eleições
À primeira vista, a revelação de Relvas é um tiro no pé. Nesta altura do campeonato, nada será tão suicidário como desvendar uma estratégia que faz o PSD correr o risco de afastar liminarmente o eleitorado mais moderado, sobretudo quando há razões acrescidas para tratar com pinças uma política de alianças. Levar o CDS ao colo para o Governo não significa apenas pôr em causa o apoio de eleitorado que não se revê nas políticas do partido mais à direita do Parlamento, mas também ignorar a má imagem deixada pela formação de Portas aquando da sua última passagem pelo poder, com alguns dos seus ministros envolvidos em casos ainda não esclarecidos - dos sobreiros à aquisição de submarinos.
As palavras de Miguel Relvas, político demasiado experiente para falar ao acaso, podem ter o mérito da clareza, evitando levar eleitorado ao engano, como já aconteceu noutras ocasiões, justamente com o PSD. Mas, como é óbvio, não são propriamente as questões de transparência a grande fonte de motivação do partido "laranja" e sim fazer o CDS reviver o seu passado pouco glorioso de partido táxi. Ou seja, quando se diz aos eleitores que seja qual for o seu resultado nas urnas, maioria absoluta incluída, o PSD conta com os populares para o Governo, está-se a descomprimir as fronteiras partidárias e a elevar o nível de atração dos votantes pelo partido mais forte da potencial coligação. Note-se que o secretário-geral dos sociais-democratas anunciou este aparente gesto de simpatia com a mesma candura com que afirmou a decisão do seu partido de ir a votos sozinho. Passos Coelho e Relvas estão claramente a jogar num CDS fraquinho e sem grande margem de manobra no terreno de eventuais negociações. Um cenário propiciado pela atual liderança do PSD, provavelmente a mais liberal de sempre, cujas propostas em matéria de mercado e de dimensão e papel do Estado são capazes de rivalizar com as do partido à sua direita.
Apesar de tudo, esta não deixa de ser uma jogada de alto risco da direção social-democrata, visto conter em si mesma todo o potencial capaz de alienar, à partida, o eleitorado central, um eleitorado tão caprichoso como ciente da sua importância na hora da contagem de votos. Isto significa que, ao contrário do que muita gente pensa, o PS não está definitivamente derrotado. Bastar-lhe-ia arranjar uma saída airosa para Sócrates (um cargo qualquer lá fora?) e eleger uma figura credível para disputar eleições. Num país em crise e sociologicamente à esquerda tanto bastaria para alterar o valor das apostas.
in "VISÃO" 01/07/10
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