Elementos filosóficos na obra vicentina
Os temas natalícios, muito presentes na obra de Gil Vicente desde a primeira encomenda de Dona Leonor, têm também um significado fortemente simbólico e sugestivo. Aqui, uma pintura do contemporâneo Vicente Gil (não confundir com o Dramaturgo!)
A obra de Gil Vicente transmite uma visão do mundo que se assemelha e se posiciona como uma perspectiva pessoal do Platonismo: existem dois mundos - o Mundo Primeiro, da serenidade e do amor divino, que leva à paz interior, ao sossego e a uma "resplandecente glória", como dá conta sua carta a D. João III; e o Mundo Segundo, aquele que retrata nas suas farsas: um mundo "todo ele falso", cheio de "canseiras", de desordem sem remédio, "sem firmeza certa". Estes dois mundos reflectem-se em temas diversos da sua obra: por um lado, o mundo dos defeitos humanos e das caricaturas, servidos sem grande preocupação de verosimilhança ou de rigor histórico.
Muitos autores criticam em Gil Vicente os anacronismos e as falhas na narrativa (aquilo a que chamaríamos hoje de "gaffes"), mas, para alguém que considerava o mundo retratado como pleno de falsidades, essas seriam apenas mais algumas, sem importância e sem dano para a mensagem que se pretendia transmitir. Por outro lado, o autor valoriza os elementos míticos e simbólicos religiosos do Natal: a figura da Virgem Mãe, do Deus Menino, da noite natalícia, demonstrando aí um zelo lírico e uma vontade de harmonia e de pureza artística que não existe nas suas mais conhecidas obras de crítica social.
Sem as características do maniqueísmo que tantas vezes se constatam nas peças teatrais de quem defende uma tal visão do Mundo, há, realmente, a presença de um forte contraste nos elementos cénicos usados por Gil Vicente: a luz contra a sombra, não numa luta feroz, mas em convivência quase amigável. A noite de natal torna-se também aqui a imagem perfeita que resume a concepção cósmica de Gil Vicente: as grandes trevas emolduram a glória divina da maternidade, do nascimento, do perdão, da serenidade e da boa vontade - mas sem a escuridão, que seria da claridade?
Legado
Os temas natalícios, muito presentes na obra de Gil Vicente desde a primeira encomenda de Dona Leonor, têm também um significado fortemente simbólico e sugestivo. Aqui, uma pintura do contemporâneo Vicente Gil (não confundir com o Dramaturgo!)
A obra de Gil Vicente transmite uma visão do mundo que se assemelha e se posiciona como uma perspectiva pessoal do Platonismo: existem dois mundos - o Mundo Primeiro, da serenidade e do amor divino, que leva à paz interior, ao sossego e a uma "resplandecente glória", como dá conta sua carta a D. João III; e o Mundo Segundo, aquele que retrata nas suas farsas: um mundo "todo ele falso", cheio de "canseiras", de desordem sem remédio, "sem firmeza certa". Estes dois mundos reflectem-se em temas diversos da sua obra: por um lado, o mundo dos defeitos humanos e das caricaturas, servidos sem grande preocupação de verosimilhança ou de rigor histórico.
Muitos autores criticam em Gil Vicente os anacronismos e as falhas na narrativa (aquilo a que chamaríamos hoje de "gaffes"), mas, para alguém que considerava o mundo retratado como pleno de falsidades, essas seriam apenas mais algumas, sem importância e sem dano para a mensagem que se pretendia transmitir. Por outro lado, o autor valoriza os elementos míticos e simbólicos religiosos do Natal: a figura da Virgem Mãe, do Deus Menino, da noite natalícia, demonstrando aí um zelo lírico e uma vontade de harmonia e de pureza artística que não existe nas suas mais conhecidas obras de crítica social.
Sem as características do maniqueísmo que tantas vezes se constatam nas peças teatrais de quem defende uma tal visão do Mundo, há, realmente, a presença de um forte contraste nos elementos cénicos usados por Gil Vicente: a luz contra a sombra, não numa luta feroz, mas em convivência quase amigável. A noite de natal torna-se também aqui a imagem perfeita que resume a concepção cósmica de Gil Vicente: as grandes trevas emolduram a glória divina da maternidade, do nascimento, do perdão, da serenidade e da boa vontade - mas sem a escuridão, que seria da claridade?
Legado
Note-se que a obra de Gil Vicente não se resume ao teatro, estendendo-se também à poesia. Podemos citar vários vilancetes e cantigas, ainda influenciadas pelo estilo palaciano e temas dos trovadores. Vários compositores trabalharam poemas de Gil Vicente na forma de lied (principalmente algumas traduções para o alemão, feitas por Emanuel von Geibel), como Max Bruch ou Robert Schumann, o que demonstra o carácter universal da sua obra. Os seus filhos, Paula e Luís Vicente, foram os responsáveis pela primeira edição das suas obras completas. Em 1586, sai à estampa uma segunda edição, com muitas passagens censuradas pela Inquisição. Só no século XIX se faria a redescoberta do autor, com a terceira edição de 1834, em Hamburgo, levada a cabo por Barreto Feio.
Obras
Monólogo do Vaqueiro (eBook) ou Auto da Visitação (1502)
Auto Pastoril Castelhano (1502)
Auto dos Reis Magos (1503)
Auto de São Martinho (1504)
Quem Tem Farelos? (1505)
Auto da Alma (1508)
Auto da Índia (1509)
Auto da Fé (1510)
O Velho da Horta (1512)
Exortação da Guerra (1513)
Comédia do Viúvo (1514)
Auto da Fama (1516)
Auto da Barca do Inferno (1517)
Auto da Barca do Purgatório(1518)
Auto da Barca da Glória (1519)
Cortes de Júpiter (1521)
Comédia de Rubena (1521)
Pranto de Maria Parda (eBook)
Farsa de Inês Pereira (1523)
Auto Pastoril Português (1523)
Frágua de Amor (1524)
Farsa do Juiz da Beira (1525)
Farsa do Templo de Apolo (1526)
Auto da Nau de Amores (1527)
Auto da História de Deus (1527)
Tragicomédia Pastoril da Serra da Estrela (1527)
Farsa dos Almocreves (1527)
Auto da Feira (1528)
Farsa do Clérigo da Beira (1529)
Auto do Triunfo do Inverno (1529)
Auto da Lusitânia, intercalado com o entremez Todo-o-Mundo e Ninguém (1532)
Auto de Amadis de Gaula (1533)
Romagem dos Agravados (1533)
Auto da Cananea (1534)
Auto de Mofina Mendes (1534)
Floresta de Enganos (1536)
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