03/08/2009

HELENA GARRIDO

O ABISMO NA JUSTIÇA

O estado de guerra na Justiça começou no dia em que José Sócrates apresentou o seu programa de Governo, em Março de 2005. Quatro anos passados, a Justiça está pior, no mínimo, porque nada melhorou. Hoje, mais do que no passado, está descredibilizada e ficou generalizado o sentimento de que há uma justiça para pobres e outra para ricos.
A estratégia de ataque e descredibilização, usada pelo Governo com os funcionários públicos e os professores, não produziu os feitos desejados na Justiça. Sócrates esqueceu-se, talvez, de que estava a enfrentar um órgão de soberania.

Na intervenção, em que submeteu ao Parlamento o Programa de Governo, cometeu o erro de anunciar como medida a redução das férias judiciais. E assim se começou a envenenar a mudança que se desejava fazer na Justiça.
Mudança essa que ficou condenada quando se tentou ganhar a batalha das férias com as mesmas armas usadas com professores e funcionários públicos.
A táctica de "não querem é trabalhar" ajudou o Governo a fazer as reformas na Educação e na Administração Pública,mas foi fatal na Justiça.
Os juízes, como o Governo e o Presidente da República, têm poder real.


Qualquer pequena possibilidade que ainda existisse de melhorar a justiça morreu quando o Governo ainda foi mais longe e pretendeu transformar os juízes em funcionários públicos.
"O nosso objectivo", disse José Sócrates aos parlamentares a 21 de Março de 2005, "é dar passos para inverter a situação actual e fazer do sistema da Justiça um factor de competitividade e desenvolvimento,tornando também mais efectiva a garantia dos direitos e dos deveres".
Um objectivo que hoje está mais longe do que há cinco anos.


Se há hoje factor que limita a vida económica, a Justiça é um dos mais importantes.
O estrangulamento que a lentidão da Justiça, e a incerteza quanto à sua aplicação, provoca no crescimento da economia pode, neste momento, ser considerado mais grave que a restrição que nos é imposta pela falta de
formação e educação.

A par da ineficácia existem hoje razões para suspeitar - talvez injustamente - que a Justiça está muito mais governamentalizada.
Os meios financeiros são uma poderosíssima arma para condicionar a actividade da Justiça.
Quando há dinheiro e pessoas para a "Operação Furacão" e não há dinheiro, nem pessoas nem apoio político para se investigar o caso Freeport ou os casos financeiros BCP, BPN e BPP, obviamente que o Governo está a condicionar a capacidade da Justiça fazer justiça.
Nestes quatro anos passámos de uma situação em que as prioridades da investigação, que permitem a aplicação da lei, pareciam estar nas mãos do Ministério Público para um quadro em que parecem estar nas mãos do Governo.
Um e outro são perigosos para a democracia.

Mais perigosa ainda é a ferida que o mau funcionamento da Justiça está a provocar no regime, na democracia. A injustiça gera vontade de fazer justiça com as próprias mãos.
O que, no mundo moderno, pode querer dizer através dos media, com a violação óbvia dos direitos que todos temos de nos defendermos.

Para o cidadão comum começa a ser claro que a Justiça não funciona porque a classe política não quer. Sem perceberem, os políticos estão a caminhar
para um abismo.


in "JORNAL DE NEGÓCIOS"

enviado por ANTÓNIO CUNHA

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