20/03/2018

RITA FONTOURA

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Ser cão já não é o que era

Depois dos restaurantes, que tal mudar o Ministério da Educação para MEPA, Ministério da Educação de Pessoas e Animais? Facilmente se integraria no concurso de professores a vertente treinador...
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Foi aprovada recentemente uma lei que permite a presença de animais domésticos nos restaurantes. Mais uma vez se vai atrás de problemas que não existiam, criando problemas neste caso, aos donos dos restaurantes, aos seus frequentadores e aos pobres dos cães (e restantes animais domésticos). Os donos dos restaurantes vão começar a ser rotulados se não consentirem a entrada de animais, nós humanos vamos sofrer com o cheiro, o barulho, a sujidade que um animalzinho provoca e os desgraçados dos animais vão passar um mau bocado, presos no restaurante em vez de estarem no jardim, terraço ou em casa, que sendo mau, é melhor do que amarrado num restaurante. Também é engraçado verificar que passamos, nós humanos, a ser descriminados. Sim, num restaurante com a nova lei, desde que o proprietário permita, não há limite ao número de animais, mas há limite ao número de pessoas!

Nada me espanta. Recentemente na minha freguesia construíram um ou dois parques para cães. Segundo o executivo “passa a haver espaços próprios para passear os cães, onde os donos e os respectivos animais podem conviver uns com os outros”.

Julgava eu que convívio era o estabelecimento ou desenvolvimento de relações amigáveis entre as pessoas, era estabelecer entre pessoas laços de amizade.

Nos parques das crianças, pais e filhos convivem e os cães ficam presos lá fora. Será que a junta prevê coleiras para os filhos dos donos dos cães ficarem à espera que termine o “convívio” entre os donos e os cães?

Ou será que para além do tempo de trabalho em que não é possível estar com os filhos, temos agora o tempo para o cão em concorrência com o tempo dos filhos?

Passados uns meses da construção dos ditos parques, verifico que ainda não corremos esse risco já que me tenho dado ao trabalho de passar pelo parque mais perto de minha casa, e apesar de me cruzar com muitos cães e seus donos, nunca consegui ainda ver nenhum parzinho a conviver no parque!

Portanto temos por enquanto apenas o desperdício de dinheiro que podia ser investido a promover a utilização civilizada do espaço público para não termos de andar com sete olhos a evitar pisar os cocós dos cães que abundam nas ruas da minha freguesia.

Como vejo esta tendência de total inversão de prioridades nos nossos governantes, pus-me a pensar nos próximos passos. Não é injusto deixar os cães o dia todo sozinhos em casa? Eu acho que sim, e sempre disse que só teria um cão se tivesse um jardim. Mas poderemos ter talvez outros caminhos: uma escola para cães onde poderão passar o dia. Porque não? E depois alargar o âmbito do Ministério da Educação para MEPA – Ministério da Educação de Pessoas e Animais. Facilmente se integraria no concurso de professores a vertente treinador. Com a diminuição do número de crianças até se poderia vir a ponderar a especialização de professores em animais, podendo manter o mesmo número de professores empregados, mudando apenas a natureza dos alunos.

Não tenho a criatividade do George Orwell, mas o receio fez trabalhar a minha imaginação. Escrevi para desabafar e, como boa portuguesa, para brincar com a situação, mas acho que vale a pena estarmos atentos aos sinais dos tempos. Há muita coisa boa a fazer. Não podemos nem devemos virar costas ao nosso mundo. Hoje existem preocupações que não tínhamos tão presentes, nomeadamente com a natureza. As novas escolhas e modos de vida vieram a encontrar na companhia dos animais uma forma de colmatar a solidão ou a companhia para o filho único. Tudo isto é real mas não nos pode levar a inverter valores. E por isso questiono: serão estas medidas legislativas amigas da sociedade e da família? São estes os problemas que temos para resolver?

Que tal pensarmos melhor em vez de irmos a reboque de tendências ou modas? É preciso trabalhar com mais seriedade e profundidade.

IN "OBSERVADOR"
17/03/18

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