28/07/2012

MARTIN FELDSTEIN


  

Uma desvalorização rápida 
   do euro pode salvar Espanha 

A possível desintegração da zona euro é hoje debatida abertamente pelas autoridades europeias e pelos executivos financeiros. 

A taxa de juro da dívida espanhola ultrapassou os 7%, reflectindo a ausência de progressos na redução do défice orçamental e dos défices de comunidades autónomas como Valencia, entre outras. É provável que a Grécia não passe na nova avaliação da ‘troika', o que, a acontecer, poderá ditar a sua saída da zona euro no Outono. Além disso, a Alemanha também se encontra sob pressão financeira devido à exposição potencial e explícita do Bundesbank aos países periféricos europeus.

A última cimeira europeia terminou com um comunicado optimista, mas sem substância. Entretanto, é provável que os mercados financeiros já estejam a pressionar Bruxelas para encontrar uma solução. A depreciação do euro poderá ser estratégica para a sobrevivência da zona euro. A moeda única depreciou no último ano cerca de 15% face ao dólar (de 1,44 para menos de 1,21 dólares). Uma nova desvalorização de 15% colocaria o euro numa situação de quase paridade com a moeda norte-americana, mantendo-se, embora, cerca de 20% acima do mínimo histórico de 84 cêntimos.
Um euro mais fraco permitiria baixar os preços das exportações da zona euro e aumentar os custos das importações, reduzindo ou eliminando os défices actuais da balança corrente dos países periféricos europeus, uma vez que metade das transacções é feita com países exteriores à zona euro. Um euro mais fraco também permitiria estimular as exportações e aumentar os salários alemães, bem como subir os preços na Alemanha e reduzir os desequilíbrios na balança comercial entre os países da zona euro.
O aumento das exportações líquidas nos países periféricos contribuiria igualmente para a subida do PIB nos mesmos, invertendo a recessão provocada pela subida de impostos e pelos cortes na despesa pública. Politicamente seria mais fácil alcançar a necessária consolidação orçamental.
Acresce que a passagem de um contexto de recessão para um contexto de crescimento faria crescer o emprego e as receitas das empresas, reduzindo o volume de crédito malparado e o incumprimento no crédito à habitação, que hoje afectam gravemente a banca.

A descida continuada do euro é um reflexo da percepção do mercado: o euro tem de desvalorizar, caso contrário a zona euro implode. Os investidores lembram a rapidez com que uma moeda pode depreciar. Dois exemplos: o euro desvalorizou perto de 30% face ao dólar no espaço de um ano, enquanto a libra esterlina depreciou 25% durante seis meses em 2008. Em suma, o euro poderá desvalorizar mesmo que o Banco Central Europeu (BCE) não adopte medidas específicas. No entanto, se o BCE enveredar por uma política monetária mais flexível, provavelmente vai acelerar
a desvalorização do euro.
Hoje, como há 20 anos, estou convencido de que é um erro impor uma moeda única a um grupo heterogéneo de países. A Europa carece de dois aspectos fundamentais: mobilidade geográfica e transferências automáticas dos estados ricos para os pobres - aquilo que permite que os EUA operem com uma moeda única. Apesar da criação da zona euro ter sido um erro económico, a sua dissolução é uma opção extremamente onerosa para governos, investidores e cidadãos.

Uma zona euro resgatada teria, contudo, de enfrentar o problema inerente à moeda única: uma política monetária desadequada em diferentes países em momentos distintos. Mas é possível que os restantes problemas do euro não perdurem. Primeiro, os mercados de obrigações não vão deixar que governos e particulares se endividem em excesso, como aconteceu na última década. Segundo, os países periféricos começam agora a introduzir as reformas necessárias para reduzir as diferenças na produtividade e nos custos unitários do trabalho, que muito contribuíram para o agravamento dos défices comerciais. Seria importante dar uma nova oportunidade ao euro, começar de novo.


* Professor de Economia em Harvard
Colunista do Financial Times 

Tradução de Ana Pina


IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
26/07/12

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