Ciência a quanto obrigas
Diz o provérbio que “fome e esperar fazem rabiar”, e não pode haver pior para o País que um político a rabiar.
Segundo o Expresso, o Tribunal Constitucional (TC) está a
fiscalizar os quartos e cozinhas dos políticos. Tal é justificado no
âmbito do controlo do património, especificamente quanto à utilização
das divisões das casas dos políticos, o que considero muito justo: se
não há um escritório, como podemos presumir que o político também
trabalha em casa? Por outro lado, se a casa não tem cozinha, como
podemos impedi-lo de apresentar ao Estado faturas de refeições? Só estou
surpreendido por o TC não querer também fotografias das divisões para
ver o que há lá dentro – é que a riqueza pode não estar no tamanho das
paredes, mas naquilo que abrigam. Não são precisos 400 metros quadrados
para pendurar um Picasso, e um jardim modesto basta para uma estátua de
Rodin. Sei que exigir fotografias requer uma alteração da lei, pois hoje
esta apenas exige uma descrição sumária do património imobiliário e
mobiliário. Tal como também sei que se tem revelado difícil alterar
estas leis de declaração de património, mas podia-se tentar ver se desta
vez dá certo.
Fixado este ponto prévio, acho muito bem que o TC investigue
quartos e cozinhas. Um político que não tenha um quarto com uma boa cama
é um político que não dorme tranquilo, e isto é inaceitável nos dias de
hoje. Se não dorme tranquilo, não pode ser um político nosso. E
fiscalizar as cozinhas é indispensável, pois um político não pode estar
sem comer. Isto não é uma mera afirmação de princípio, é uma verdade
científica: em antecipação a uma refeição, o nosso estômago produz uma
hormona chamada grelina. A grelina não tem nada a ver com grelos, é a
hormona que nos faz sentir fome. Ora, Karolina Skibicka, da Universidade
de Gotemburgo, demonstrou que a produção de grelina tem efeitos
negativos na tomada de decisões, pois torna-nos mais impulsivos e menos
racionais. Diz o provérbio que “fome e esperar fazem rabiar”, e não pode
haver pior para o País que um político a rabiar.
Assim, louvo o Tribunal Constitucional por esta importante e
justificada prática, mas peço-lhe que dedique o mesmo entusiasmo à
investigação das casas de banho. É que foi provado por Mirjam A. Tuk,
Debra Trampe e Luk Warlop, da Universidade Católica de Louvain
(Bélgica), no seu paper “Inhibitory spillover: Increased urination
urgency facilitates impulse control in unrelated domains”, que tomamos
decisões mais arriscadas quando estamos cheios de vontade de ir à casa
de banho. E quando um político toma decisões arriscadas, os riscos são
nossos.
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
18/03/17
.
Sem comentários:
Enviar um comentário